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sábado, 29 de dezembro de 2012

A Fidelidade de Deus e a minha Fidelidade


Mensagem pregada em nossa congregação no dia 23 de dezembro de 2012. Espero que o Senhor Deus possa lhe falar ao coração; e deixo o convite para você que procura uma Igreja, de fazer da nossa Igreja a sua Igreja. Que Deus vos abençoe no nome de Jesus Cristo.
Localização: Estrada Meringuava 1192 fundos, loja 1 Taquara - Rio de Janeiro.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Salvação pela Graça mediante a Fé



A característica distintiva da verdade do Evangelho de Cristo é a graça – favor imerecido de Deus para conosco. Em contraste, a religião mundana é um sistema de leis, regulamentos e obras. Isso é facilmente entendido e aceito pelo mundo, que pensa que devem fazer algo para merecer sua salvação e aceitação por Deus. Nossa tendência natural é colocar-nos no centro, pensando que somos capazes de ao menos contribuir para a nossa salvação.  Todavia, nunca podemos merecer o amor de Deus. Ele nos vem como um dom gratuito: “Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie” (Ef. 2:8, 9). O dom gratuito da salvação é explicado adicionalmente na epístola de Paulo aos Romanos:

Todavia, não é assim o dom gratuito como a ofensa; porque, se, pela ofensa de um só, morreram muitos [a pecaminosidade imputada de Adão], muito mais a graça de Deus e o  dom pela graça de um só homem, Jesus Cristo, foram abundantes sobre muitos. O dom, entretanto, não é como no caso em que somente um pecou; porque o julgamento derivou de uma só ofensa, para a condenação; mas a graça transcorre de muitas ofensas, para a justificação. Se, pela ofensa de um e por meio de um só, reinou a morte, muito mais os que recebem a abundância da graça e o dom da justiça reinarão em vida por meio de um só, a saber, Jesus Cristo. (Rm. 5:15-17; ênfase minha).

A salvação é um dom gratuito porque não poderíamos adquiri-la através de obras ou mérito da nossa parte. Somos justificados, significando que somos feitos justos em nosso relacionamento com Deus, onde ele não mais olha para o nosso pecado, através da justiça de Cristo que é aplicada em nós mediante a nossa fé. À medida que Paulo fornece uma lista de pecados aos quais nós como crentes fomos uma vez escravos antes de crermos, ele contrasta isso com a obra da graça de Deus em nós agora.

Quando, porém, se manifestou a benignidade de Deus, nosso Salvador, e o seu amor para com todos, não por obras de justiça praticadas por nós, mas segundo sua misericórdia, ele nos salvou mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo, que ele derramou sobre nós ricamente, por meio de Jesus Cristo, nosso Salvador, a fim de que, justificados por graça, nos tornemos seus herdeiros, segundo a esperança da vida eterna (Tito 3:4-7).
                                                 
Mesmo a capacidade de crer em Cristo pela fé é um dom gratuito de Deus. Como pecadores não-regenerados não podemos fazer isso à parte da obra  do Espírito de Deus em nós (cf. 1Co. 2:14; Tito 3:5). Embora estivéssemos separados de Deus pelo nosso pecado, ele iniciou um relacionamento conosco. “Mas Deus prova o seu próprio amor para conosco pelo fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda pecadores” (Rm. 5:8). Tendemos a olhar para nós mesmos a fim de descobrir o motivo pelo qual Deus deveria nos amar. Ele não nos vê resplandecentes em nossas boas obras. O que Deus vê é uma vida cheia de culpa, rebelião, egoísmo, idolatria e vergonha, a menos que sejamos vestidos pela justiça de Cristo. Mas é claro a partir da Palavra de Deus que Deus nos ama somente porque estamos em Cristo Jesus, que em amor deu sua vida por nós. “Assim como nos escolheu nele antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis perante ele; e em amor nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo, segundo o beneplácito de sua vontade” (Ef. 1:4-5). “Que nos salvou e nos chamou com santa vocação; não segundo as nossas obras, mas conforme a sua própria determinação e graça que nos foi dada em Cristo Jesus, antes dos tempos eternos, e manifestada, agora, pelo aparecimento de nosso Salvador Cristo Jesus…” (2Tm. 1:9, 10). A salvação é totalmente a obra de Deus (Sl.
3:8; Jonas 2:9; Ap. 19:1). Portanto, quando o carcereiro de Filipo perguntou aos prisioneiros Paulo e Silas, “Senhores, que devo fazer para que seja salvo?”, eles responderam,  “Crê no Senhor Jesus e serás salvo, tu e tua casa” (Atos 16:30, 31; ênfase minha).

Embora a fé para crer seja um dom da parte de Deus, ela é algo que somos instados a usar diligentemente ao buscá-lo. “De fato, sem fé é impossível agradar a Deus, porquanto é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe e que se torna galardoador dos que o buscam” (Hb. 11:6). Aproximamos-nos de Deus e o encontramos através de Jesus, que é o caminho e é quem nos mostra o Pai (João 14:6-11). A recompensa última da nossa fé é receber a vida eterna agora e, entrando no céu mediante a morte física, ficarmos na presença de Deus. Tendo agora recebido pela graça essa fé, podemos cantar o hino de James M. Boice, Visto que a graça é a fonte da vida que é minha – E a fé é um dom do alto – Gloriar-me-ei em meu Salvador, todo mérito declinarei, E glorificarei a Deus até eu morrer.

baseado no livro de Bruce McDowell

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Os Decretos Eternos de Deus



Em nossa consideração destas doutrinas bíblicas, chegamos agora a uma nova seção da doutrina particular com que estivemos tratando, ou seja, a doutrina sobre Deus. Vocês se lembrarão de que temos considerado o que a Bíblia nos diz sobre o ser, a natureza e o caráter de Deus, como aprouve a Ele nos revelar essas particularidades nas Escrituras. Consideramos, igualmente, os nomes que Deus aplicou a Si próprio como uma parte desta revelação de Seu ser essencial, bem como Sua relação com a criação. E isso, por sua vez, nos trouxe à consideração da grande, poderosa e inescrutável doutrina da bem-aventurada santíssima Trindade.

Agora, considerando ainda a doutrina sobre Deus, chegamos à próxima seção, que é obviamente a seguinte: as obras de Deus; a atividade de Deus; o que Deus fez. Esta é uma espécie de subseção ou ramo da doutrina geral concernente a Deus. E a pergunta é: o que vem a seguir? Que é que vamos considerar? Estamos para considerar as obras de Deus; portanto, se lhes fosse formulada a seguinte pergunta: “O que vocês pensam vir a seguir na seqüência bíblica e na ordem lógica?” Sinto-me curioso em saber a resposta que vocês dariam. Posso estar equivocado, mas acredito que, se eu fosse fazer a pergunta, muitos provavelmente diriam que obviamente nos dirigiremos imediatamente à doutrina da Criação.

Ora, é evidente que há um sentido em que essa seria a resposta correta, mas, francamente, a minha impressão é que não é, embora descobrirão, se examinarem certos livros que tratam destes assuntos, que é precisamente isso o que eles fazem. Vocês poderiam citar um bom número de autoridades que vão diretamente da doutrina da natureza e caráter de Deus à questão da Criação. Mas tal procedimento parece-me completamente errôneo. E antibíblico, e portanto não é a coisa certa e própria a fazer.

Antes de abordarmos a doutrina sobre a Criação, há algo que devemos considerar primeiro, e procedemos assim porque a Bíblia nos fala sobre ele, ou seja, a Bíblia, antes mesmo de dizer-nos o que Deus fez, nos conduz ao caráter de todas as atividades de Deus. Há muito na Bíblia, como pretendo mostrar-lhes, sobre o modo como Deus faz as coisas, e é importante que consideremos isso antes de considerarmos exatamente o que Deus fez.

Há seguramente grandes princípios que sublinham e caracterizam todas as obras de Deus. Noutras palavras, antes de Deus criar o mundo e o homem, Ele ponderou, Ele intentou e determinou certas coisas. Daí, esta abordagem deve entrar neste ponto. Certas coisas foram decididas na mente e no conselho eternos de Deus, antes que Ele fizesse qualquer coisa no âmbito da Criação, e a impressão que tenho, portanto, é que esta é a seqüência obviamente cronológica (se podemos usar tal termo), certamente a seqüência obvia e lógica que deve ser seguida.

Ora, a descrição que é apresentada na Bíblia referente ao modo ou ao método de Deus operar consiste no que comumente se chama a doutrina dos decretos eternos de Deus. Essas são coisas que Deus determinou e ordenou antes que tivesse feito qualquer coisa. Ora, quero admitir muito francamente que estou chamando sua atenção outra vez para um tema extremamente difícil. Não peço desculpas por isso porque, como lhes mostrarei, esta não é uma questão de escolha. A obrigação de alguém, ao expor a Bíblia, é a de expor toda a Bíblia. Todavia admito que este é um tema muito difícil, e creio que é por isso que muitos dos livros não o incluem. Mas ele é tão escriturístico, que precisa ser encarado. É como a doutrina sobre a santíssima Trindade -em certo sentido, se acha além de nossas mentes. Entretanto, segundo vimos acerca dessa doutrina, não devemos evitá-la só pelo fato de ser difícil.

Para o encorajamento de vocês, contudo, creio poder prometer-lhes que algumas destas doutrinas primárias e preliminares são mais difíceis em razão de estarmos tratando com a mente do Eterno, e de estarmos, portanto, considerando algo que se acha além do nosso finito entendimento e da apreensão de nossos débeis e ínfimos intelectos. De certo ponto de vista, as doutrinas do homem, da criação e da salvação são, necessariamente, muito mais fáceis.

“Mas”, alguém poderá dizer, “em vista da dificuldade e inescrutabilidade dela, por que é preciso considerá-la? Por que não entramos diretamente nas doutrinas da Criação, do homem e da Queda? É nisso que estamos realmente interessados; é isso que queremos saber.” Muito bem, é preciso que apresentemos algumas respostas a uma objeção como essa. Minha primeira razão para chamar sua atenção para esta doutrina, como já me expressei, é que ela se acha revelada na Bíblia; e diante desse fato, ela exige obviamente a nossa consideração e estudo.

Posso colocá-lo assim: não seria bastante surpreendente observar e considerar quão inclinados somos nós a ler apenas certas porções da Bíblia? Gostaria de saber se vocês lêem o nono capítulo da Epístola aos Romanos com tanta freqüência como lêem o oitavo. Se porventura vocês são daqueles que lêem a Bíblia a esmo, então não o fazem. Ora, não temos o direito de escolher e selecionar somente o que queremos da Bíblia. já concordamos que ela é a Palavra inspirada de Deus. Se creio nisso acerca da Bíblia, do começo ao fim, então devo levar em conta toda a minha Bíblia. O fato de haver porções que me deixam perplexo, não é motivo para afastar-me delas. Devo lê-Ia inteiramente, apegar-me a ela toda; devo tentar compreendê-la totalmente. E desde que esta eminente doutrina dos decretos de Deus está na Bíblia, então é minha obrigação estudá-la.

Eis outra razão - e creio que vocês concordarão comigo quando tivermos concluído: ela nos revelará inusitados aspectos da glória do próprio Deus. Ela nos oferecerá, por assim dizer, uma maior e mais excelente concepção de Deus, o que, por sua vez, promoverá nossa adoração a Deus. jamais me canso de dizer que a real dificuldade da evangelização moderna é que não empregamos tempo suficiente com a doutrina a respeito de Deus.

Sentimo-nos tão interessados numa experiência subjetiva, e numa salvação subjetiva, que nos esquecemos desta doutrina do próprio Deus; e tal fato é responsável por muitos de nossos conflitos e problemas. Quanto mais conhecermos sobre Deus e Sua infinitude, tanto mais O adoraremos.

Outra razão, portanto, para considerarmos esta doutrina está no fato de que ela nos poupará de muitos erros. A maioria dos erros em que homens e mulheres têm caído ao longo dos séculos, e em muitas outras questões que se tem suscitado, tem sido em razão do fato de nunca terem chegado a compreender, como deviam compreender, o ensino da Bíblia no tocante aos decretos eternos de Deus.

E minha última razão para chamar sua atenção para ela é que, quanto a mim, não conheço nada que me transmite maior consolação do que esta doutrina particular. Não hesito em dizer que nada me transmite conforto mais Profundo do que saber que por trás de mim, ínfima criatura que sou, transitando por este mundo momentâneo, existe esta doutrina dos decretos eternos do próprio Deus.

Muito bem, se essa é a razão por que a estamos considerando, então deixem-me dizer apenas uma palavra sobre como a consideraremos, e como tal coisa é tão importante. A primeira coisa que temos a fazer, quando estamos considerando esta doutrina, consiste em livrar-nos de nossos preconceitos e de todo e qualquer gênero de espírito partidário. Pelo termo “espírito partidário” quero dizer que todos nós somos inclinados a assumir certas posições e, inconscientemente, estamos às vezes muito mais preocupados em defender o que pensamos ser aquilo em que temos sempre crido, do que em descobrir a verdade.

A outra forma negativa é que não devemos aproximar-nos deste tema filosoficamente. Sei que continuo falando sobre isso! A filosofia é uma grande maldição na esfera da fé cristã porque, por implicação, a filosofia é sempre algo que se inclina a entender todas as coisas como um todo. Esse é o intento da filosofia -avaliar tudo com a mente humana. Mas estamos agora tratando de algo para o qual a mente é completamente inadequada.

Portanto, devemos compreender que, quando nos aproximamos deste tema, há aspectos dele que, por implicação, não conseguiremos entender.

E então, positivamente, devemos aproximar-nos deste tema com humildade; devemos aproximar-nos dele com reverência; devemos aproximar-nos dele pela fé e com uma pronta admissão de nossas próprias limitações. Devemos aproximar-nos dele com uma mente aberta, buscando e inquirindo pelo ensino das Escrituras. Devemos achegar-nos num espírito infantil, prontos a receber o que nos é revelado, e prontos, devo acrescentar, a não fazer perguntas que vão além da revelação das Escrituras.

Aliás, estou cada vez mais convencido de que fé é a disposição de alguém submeter-se aos limites bíblicos. É a disposição de não fazer perguntas sobre coisas que não se acham reveladas nas Escrituras. Fé consiste em dizer: “Muito bem, levarei em conta tudo quanto é registrado na Bíblia, e não quero saber de nada mais além disso. Estou satisfeito com a revelação.” Devemos aproximar-nos desta grande doutrina dessa forma.

Acima de tudo, é preciso que compreendamos que há certas coisas que, com nossas mentes finitas, não seremos capazes de conciliar umas com as outras. Ora, estou tentando evitar o uso de termos técnicos o quanto posso, todavia aqui devo introduzir a palavra antinomia - não antimônio. O que é uma antinomia? E aquela posição em que nos são dadas duas verdades, as quais, por nós mesmos, não podemos conciliar. Há certas antinomias finais na Bíblia, e, como pessoas de fé, devemos estar dispostos a aceitar tal fato. Quando alguém diz: “Oh, mas você não pode conciliar esses dois”, você deve prontamente dizer: “É verdade, não posso. Não presumo ser capaz de fazê-lo. Eu não sei. Só creio no que me é dito nas Escrituras.”

Pois bem, aproximamo-nos desta grande doutrina assim: à luz das coisas que já consideramos sobre o ser, a natureza e o caráter de Deus, esta doutrina dos decretos eternos deve ser deduzida como uma necessidade suprema e absoluta. Devido Deus ser quem é e o que Ele é, Ele tem de operar da maneira como Ele opera, Como temos visto, todas as doutrinas na Bíblia são consistentes umas com as outras, e quando estamos considerando alguma doutrina específica, devemos lembrar que ela deve ser sempre consistente com todas as demais. Portanto, quando decidimos estudar o que a Bíblia nos afirma sobre o modo como Deus age, devemos tomar cuidado para não dizermos algo que contradiga o que já afirmamos sobre Sua onisciência, Sua onipotência e todas as demais coisas, que juntos temos concordado estarem nas Escrituras.

Ora, tendo dito tudo isso, permitam-me fazer uma afirmação positiva da doutrina e, a fim de torná-la clara, pô-la-ei na forma de uma série de princípios. O primeiro é que, desde a eternidade, Deus tem tido um plano imutável com referência às Suas criaturas. A Bíblia está constantemente fazendo uso de uma frase como esta: “Antes da fundação do mundo” (Vejam Ef. 1:4). Como o apóstolo Paulo disse sobre o nascimento de nosso Senhor: “Mas, vindo a plenitude dos tempos...” (GáI. 4:4).

Podemos colocá-lo em termos negativos: Deus jamais faz algo com indiferença. Nunca há algo incerto em Suas atividades. Poderia pô-lo ainda noutra forma: Deus jamais tem uma segunda reflexão. Lembrem-se de que já concordamos que Ele é onisciente e onipresente, que Ele conhece tudo desde o princípio ate o fim, Portanto Ele não pode ter uma segunda reflexão. Nada é acidental, casual, incerto ou fortuito. Deus tem um plano, um propósito definido sobre a criação, sobre os homens e as mulheres, sobre a salvação, sobre a vida neste mundo na sua totalidade, sobre o fim de tudo, sobre o destino final. Tudo o que Deus tem feito e causado é segundo o Seu próprio plano eterno, e esse é fixo, certo, imutável e absoluto. Essa é a primeira afirmação.

A segunda consiste em que o plano de Deus compreende e determina todas as coisas e eventos, de toda espécie, que acontecem. Se vocês crêem que Deus determinou certos fins, então precisam crer que Ele determina tudo o que conduz a esses fins. Se crêem que Deus decidiu criar num dado ponto, que Ele decidiu que o fim do mundo, de acordo com o tempo, deve suceder num dado ponto, seguramente, se o fim é determinado, tudo o que conduz a esse fim deve ser também determinado; e vocês compreendem que há também uma espécie de interrelação entre todos os eventos e coisas que acontecem, e que todos estão se dirigindo para esse fim. Desse modo, a doutrina dos decretos eternos de Deus declara que todas as coisas são finalmente determinadas e decretadas por Ele.

Por conseguinte, se tudo está determinado por Deus, devem-se incluir, necessariamente, as ações livres, as ações voluntárias de agentes livres e voluntários. Ora, essa é uma afirmação fundamental. Deixem-me fragmentá-la um pouco e apresentar-lhes a evidência escriturística. Com respeito ao sistema como um todo, isso é colocado muito claramente pelo apóstolo Paulo. Diz ele: “De tornar a congregar em Cristo todas as coisas, na dispensação da plenitude dos tempos, tanto as que estão nos céus como as que estão na terra; nele, digo, em quem também fomos feitos herança, havendo sido predestinados, conforme o propósito daquele que faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade” (E£ 1: 10,11). Com efeito, isso se aplica a todas as coisas. Paulo está falando ali do cosmo como um todo sendo unido em Cristo, e ele diz que Deus irá realizar isso dessa maneira.

Em seguida temos mais evidência escriturística a demonstrar que Deus, dessa maneira, governa, controla e determina os eventos que aparentam aos nossos olhos ser totalmente fortuitos. No livro de Provérbios, lemos: “A sorte se lança no regaço, mas do Senhor procede toda a sua disposição” (Prov. 16:33). Chamamos “sorte” uma questão de probabilidade e casualidade, não é verdade? Vocês “lançam” a sorte. Sim, diz essa passagem das Escrituras: “mas do Senhor procede toda a sua disposição”. Também no Novo Testamento lemos que nosso Senhor diz: “Não se vendem dois passarinhos por um ceitil? e nenhum deles cairá em terra sem a vontade de vosso Pai” (Mat. 10:29), Um pequeno pardal estatela-se morto e cai por terra. Acidente, diz você. Casualidade. Absolutamente, não! “Nenhum deles cairá em terra sem a vontade de vosso Pai.” A vida de um pequeno pardal está nas mãos de Deus. Ele, porém, prossegue: “E até mesmo os cabelos da vossa cabeça estão todos contados” (v. 30). Há eventos que parecem ser totalmente acidentais, no entanto são controlados por Deus.

Em seguida, tomem nossas ações livres. Leiam Provérbios 2 1: 1: “Como ribeiros de águas, assim é o coração do rei na mão do Senhor; a tudo quanto quer o inclina.” O rei parece estar livre, porém Deus está controlando-o como controla os próprios rios. Efésios 2: 10 nos declara: “Porque somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas.” E Filipenses 2:13 nos diz: “Porque Deus é o que opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a sua boa vontade.”

Não obstante, chegamos a algo mais extraordinário e surpreendente: as Escrituras nos ensinam que até mesmo as ações pecaminosas estão nas mãos de Deus. Ouçam Pedro pregando no dia de Pentecoste, em Jerusalém: “A este que vos foi entregue pelo determinado conselho e presciência de Deus, tomando-o vós, o crucificastes e matastes pelas mãos de injustos” (Atos 2:23). Em seguida, Pedro o coloca nestes termos: “Porque verdadeiramente contra o teu santo Filho Jesus, que tu ungiste, se ajuntaram, não só Herodes, mas Pôncio Pilatos, com os gentios e os povos de Israel” - prestem atenção – “para fazerem tudo o que a tua mão e o teu conselho tinham anteriormente determinado que se havia de fazer” (Atos 4:27,28). O terrível pecado daqueles homens fora determinado de antemão, pelo conselho de Deus.

Temos também um tremendo exemplo disso no livro de Gênesis, aquela famosa declaração de José a seus irmãos. José, rememorando os fatos de sua história, virou para seus irmãos e disse: “Assim não fostes vós que me enviastes para cá, e sim Deus...” (Gên. 45:8). Do nosso ponto de vista, foram eles que o fizeram. Eles haviam agido perversamente, haviam feito algo muito ímpio, movidos por motivos mercenários e como resultado de sua própria inveja. “Mas”, disse José, “não fostes vós que me enviastes para cá, e sim Deus”. Estas ações pecaminosas emanaram deste grande e eterno decreto de Deus.

Ora, sejamos bem explícitos sobre isto. Em vista do que já concordamos sobre a santidade de Deus, devemos uma vez mais dizer o seguinte: Deus não causa o mal em nenhum sentido, em nenhum grau. Deus não aprova o mal. Ele, porém, permite que os agentes perversos o realizem, e então o administra para Seus próprios fins sábios e santos.

Ou avaliem-no assim, se o preferirem: o mesmo decreto de Deus que ordena a lei moral, que proíbe e pune o pecado, também permite sua ocorrência. Limita-o, porém, e determina o canal específico ao qual ele será restringido, bem como a finalidade exata para a qual ele será dirigido, e controla suas conseqüências para o bem. A Bíblia nos ensina isso claramente. Ouçam novamente aquele relato sobre José e seus irmãos em Gênesis 50:20. Disse José: “Vós bem intentastes mal contra mim, porém Deus o tornou em bem, para fazer como se vê neste dia, para conservar em vida a um povo grande.” E creio que, em muitos aspectos, o exemplo mais chocante de todos se encontra na traição de Jesus por Judas: uma ação livre e voluntária, e no entanto um componente do grande e eterno propósito e plano de Deus.

Assim sendo, isso me conduz à minha terceira proposição geral, ou seja: todos os decretos de Deus são incondicionais e soberanos. Eles não dependem, em nenhum sentido, das ações humanas. Não são determinados por alguma coisa que a pessoa possa ou não fazer. Os decretos de Deus não são nem ainda determinados à luz do que Ele sabe que as pessoas irão fazer. Eles são absolutamente incondicionais. Não dependem de nada, a não ser da própria vontade e da própria santidade de Deus.

Entretanto - quero deixar isto bem claro - não significa que não exista o que se chama causa e efeito na vida. Isso não significa que não exista o que se chama ações condicionais. Sim, existe aquilo a que se chama, na natureza e na vida, causa e efeito. O que a doutrina afirma, porém, é que cada causa e efeito, bem como as ações espontâneas, são componentes do decreto do próprio Deus. Ele determinou agir dessa maneira particular. Deus decretou que o fim que Ele tem em vista será cumprido, certa e inevitavelmente, e que nada poderá impedi-lo nem frustrá-lo.

Deixem-me apresentar-lhes agora a minha evidência para tudo isso. Tomem a profecia de Daniel: “E todos os moradores da terra são reputados em nada; e segundo a sua vontade ele opera com o exército do céu e os moradores da terra: não há quem possa estorvar a sua mão, e lhe diga: que fazes?” (Dan. 4:35). Nada pode impedir a mão de Deus, nem mesmo questioná-la. Ou então ouçam a nosso Senhor afirmar este mesmo fato em Mateus 11:25,26: “Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, que ocultaste estas coisas aos sábios e entendidos, e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque assim te aprouve.” Por que Deus tem escondido estas coisas aos “sábios e entendidos” e as revelado aos “pequeninos”? Só existe uma resposta – “porque assim te aprouve”, porque assim pareceu bem aos Seus olhos.

Paulo também afirma a mesma coisa: “E nos predestinou para filhos de adoção por Jesus Cristo, para si mesmo, segundo o beneplácito de sua vontade’ (Ef. 1:5). Recomendo-lhes um cuidadoso estudo da primeira metade do primeiro capítulo da Epístola aos Efésios. Atentem bem para tudo o que ela diz, e saberão que tudo o que Deus tem feito é sempre “segundo o beneplácito de Sua vontade”. Nada mais, absolutamente. E inteiramente pela graça.

Mas, naturalmente, vocês encontrarão esta doutrina afirmada ainda mais claramente naquele grande e poderoso capítulo nove da Epístola aos Romanos. Desejo, neste momento, enfatizar especialmente o versículo 11. Vocês descobrirão que ele é um versículo entre parênteses; porém, que grandioso versículo! Que declaração! “Porque, não tendo eles ainda nascido, nem tendo feito bem ou mal (para que o propósito de Deus, segundo a eleição, ficasse firme, não por causa das obras, mas por aquele que chama).” O argumento de Paulo consiste em que Deus decretara que o mais velho servisse ao mais jovem, porque, mesmo antes que houvessem nascido, Ele havia dito: “Amei Jacó, e aborreci Esaú” (v. 13).

“Por que”, vocês perguntam, “Deus amou Jacó, porém odiou Esaú? Foi em razão do que eles fizeram?” Não. Antes que nascessem, antes mesmo que fossem concebidos, Deus escolheu Jacó e não Esaú. Não tinha nada a ver com suas obras, em sentido algum.

O propósito de Deus é incondicional e absolutamente soberano. Ouçam a Paulo dizer novamente: “Que diremos, pois? que há injustiça da parte de Deus? de maneira nenhuma” (Rom. 9:14). Que Deus os livre de chegarem a tal conclusão! E impossível – “Pois diz a Moisés: compadecer-me-ei de quem me compadecer, e terei misericórdia de quem eu tiver misericórdia. Assim, pois, isto não depende do que quer, nem do que corre, mas de Deus, que se compadece. Porque diz a Escritura a Faraó: para isto mesmo te levantei; para em ti mostrar o meu poder, e para que o meu nome seja anunciado em toda a terra. Logo, pois, compadece-se de quem quer, e endurece a quem quer." (Rom. 9:15-18)

Deixem-me apresentar o quarto princípio, o qual é que: os decretos de Deus são eficazes. Ora, isso, naturalmente, se deduz necessariamente. Visto que Deus é um Senhor soberano, em virtude de Sua onipotência e de Sua grandeza, Seus propósitos jamais podem fracassar. O que Deus determina e decreta, infalivelmente devera ser cumprido. Nada pode impedi-lo. Nada pode frustrá-lo.

E isso me traz ao quinto princípio: os decretos de Deus são em todos os aspectos perfeitamente consistentes com Sua própria natureza muitíssimo sábia, benevolente e santa. Creio que não é necessário que eu argumente tal fato. Noutras palavras, não existe contradição em Deus. Nem pode haver. Deus é perfeito, como temos visto, e Ele é absoluto, e tudo quanto estou expressando agora se entrosa perfeitamente com tudo quanto já consideramos antecipadamente. Conforme já os adverti na introdução, vocês e eu, aqui na terra, com nossas mentes finitas e pecaminosas, somos confrontados com um problema. Ei-lo: por que Deus decretou permitir o pecado? E há somente uma resposta a essa pergunta: simplesmente não sabemos. Sabemos que Ele decretou permitir o pecado, do contrário o pecado jamais teria acontecido. Por quê, não sabemos. Eis aqui um problema insolúvel. Veremos, porem, tudo claramente quando estivermos na glória e face a face com Deus.

De duas coisas podemos estar certos e devemos sempre asseverar: primeira, Deus jamais é a causa do pecado. Em Habacuque 1: 13, vocês encontrarão expresso: “Tu és tão puro de olhos, que não podes ver o mal.” Tiago diz: “... Deus não pode ser tentado pelo mal, e a ninguém tenta” (Tiago 1: 13). Segunda, o propósito de Deus é, em todas as coisas, perfeitamente consistente com a natureza e o modo de agir de Suas criaturas. Noutras palavras, ainda que não possamos conciliá-lo, há uma conciliação final. Os decretos de Deus não negam a existência de agentes livres. Tudo o que sabemos é isto: ainda que Deus concedeu esta liberdade, Ele, não obstante, a tudo governa a fim de que Seus fins determinados possam ser concretizados.

Como pode Deus decretar tudo e ainda manter-nos responsáveis pelo que fazemos? Eis a resposta: “Mas, ó homem, quem és tu, que a Deus replicas? Porventura a coisa formada dirá ao que a formou: porque me fizeste assim? Ou não tem o oleiro poder sobre o barro, para da mesma massa fazer um vaso para honra e outro para desonra? E que direis se Deus, querendo mostrar a sua ira, e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita paciência os vasos da ira, preparados para perdição; para que também desse a conhecer as riquezas da sua glória nos vasos de misericórdia, que para glória já dantes preparou” (Rom. 9:20-23).

“Mas”, talvez vocês perguntem, “como você concilia estas duas coisas?”

Respondo: não posso. Sei que a Bíblia me afirma as duas coisas: que o homem, em certo sentido, é um agente livre, e, em contrapartida, que os decretos eternos de Deus governam todas as coisas.

Em seguida, devo apresentar minha última proposição, ou seja, a salvação dos homens e das mulheres e dos anjos e alguns deles em particular foi determinada por Deus antes da fundação do mundo. Isso Ele faz inteiramente de acordo com o Seu beneplácito e de Sua graça. Devo remetê-los novamente a Mateus 11:25,26. E em João 6:37, lemos: “Todo aquele que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora.” E no versículo 44 nosso Senhor diz: “Ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou o não trouxer.” Em Atos 13:48, leio o seguinte: “e creram todos quantos estavam ordenados para a vida eterna.”

Em 2 Tessalonicenses 2:13, vocês encontram: “Mas devemos sempre dar graças a Deus por vós, irmãos amados do Senhor, por vos ter Deus elegido desde o princípio para a salvação, em santificação do Espírito, e fé da verdade.” Em seguida, em sua carta a Timóteo, Paulo diz: “Que nos salvou, e chamou com uma santa vocação; não segundo as nossas obras, mas segundo o seu próprio propósito e graça que nos foi dada em Cristo Jesus antes dos tempos dos séculos” (2 Tim. 1:9).

Especialmente, porém, gostaria de enfatizar novamente aquela grande afirmação, a qual já citei, de Romanos 9:20-23. O apóstolo Paulo, pregando esta grande doutrina dos decretos eternos de Deus, imagina alguém em Roma dirigindo-lhe uma pergunta e dizendo: eu não entendo isso. A mim soa contraditório, injusto. Se o que você me diz sobre estes decretos é verdadeiro, então a impressão que fica é que Deus é injusto. O questionador diz a Paulo: “Por que se queixa ele ainda? Porquanto, quem resiste à sua vontade?” (Rom. 9:19).

E a réplica de Paulo é: “Mas, ó homem, quem és tu, que a Deus replicas? Porventura a coisa formada dirá ao que a formou: por que me fizeste assim? Ou não tem o oleiro poder sobre o barro, para da mesma massa fazer um vaso para honra e outro para desonra? E que direis se Deus, querendo mostrar a sua ira, e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita paciência os vasos da ira, preparados para perdição; para que também desse a conhecer as riquezas da sua glória nos vasos de misericórdia, que para glória já dantes preparou.”

Eis aí a resposta do apóstolo. Eis aí a resposta das Escrituras. Eis aí, portanto, a resposta de Deus, a nós e por nós, enquanto estamos neste mundo passageiro. Ela se acha além de nós. Não podemos apreender o supremo funcionamento da mente de Deus. Não adianta perguntar: por que isso? e, por que aquilo? Por que Deus levantou Faraó? Por que Ele escolheu Jacó e não Esaú? Por que Ele nos castiga, se todas as coisas estão determinadas e decretadas? A resposta é: “Mas, ó homem, quem és tu?” Vocês estão opondo sua própria mente contra a de Deus. Estão ignorando quão ínfimos vocês são, quão finitos vocês são, quão pecaminosos em resultado da Queda. Vocês têm que abrir mão do entendimento até chegarem à glória. Tudo o que vocês têm a fazer aqui, no momento, é crer que Deus é sempre consistente conSigo mesmo, e aceitar o que Ele explícita e abertamente nos revelou sobre Seus decretos eternos, sobre o que Ele determinou e decidiu antes mesmo que criasse o mundo.

E, acima de tudo, compreendam que, se vocês são filhos de Deus, é em razão de Deus o ter determinado, e o que Ele determinou a seu respeito é indiscutível, seguro e certo. Nada e ninguém pode jamais tirá-los de Suas mãos, nem tampouco levá-1O a renunciar Seu propósito com relação a vocês. A doutrina dos decretos eternos de Deus existiu antes da fundação do mundo. Ele me conheceu. Conheceu a vocês. E os nossos nomes foram escritos no “livro da vida do Cordeiro” antes mesmo que o mundo fosse criado, antes mesmo que vocês e eu, ou algum outro, entrássemos nele.

Curvemo-nos diante de Sua Majestade. Humilhemo-nos em Sua augusta presença. Submetamo-nos à revelação que Ele tão graciosamente Se agradou em nos comunicar.



Extraído do livro “Deus o Pai, Deus o Filho” Dr. Martyn Lloyd-Jones – Editora PES.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Graça e Comunhão


O salmista, no Salmo 84.11, afirma que “O Senhor dará graça e glória”. Nisso reside a grande verdade de que a graça de Deus na vida dos eleitos é a promessa de sua glória por vir. Na verdade, é mais do que a promessa, é essencial e indiscutivelmente uma parte da glória em si. Graça atual é a glória futura. Aquele que tem o menor grau de graça em sua alma tem os começos de glória.
Há grande consolação nessa verdade, uma vez que é o cultivo de uma perspectiva eterna que, segundo as Escrituras, nos dá conforto durante os momentos de sofrimento dessa vida.
Ao longo da vida cristã aprendemos que “graça”, por definição, é algo que não podemos ganhar, não merecemos, não considera mérito e que é a nossa única esperança de salvação. Algo muito importante é que a razão de nossa confiança é a Graça de Deus.
A Graça é um dos termos mais preciosos e significativos da Bíblia. Ele fala da livre e incondicional escolha de Deus de um povo para si e eternamente amado. Ele fala de Sua misericórdia para com os miseráveis, de Seu perdão para os culpados, de Seu favor para os perdidos, de Seu amor livre e sem limites para os pobres pecadores.
Certa ocasião, ouvindo o Rev. Wadislau Gomes, obtive uma ainda melhor compreensão da graça. Explicando o termo, contou-nos sobre o hábito de certos lugares de se indagar sobre o nome de pessoas com seguinte pergunta: “Qual a sua graça?”. Pois bem, Rev. Wadislau disse que “a dele”, a graça em sua vida, “era Cristo”. E é exatamente isso, o nosso Senhor Jesus, o dom inefável de Deus, é o depositário da graça. O nosso mediador perfeito é a Cabeça e a Fonte de toda a graça aos seus santos. Nele habita toda a plenitude da graça, no passado, no presente e no futuro!
Isso mesmo, no futuro! Porque a graça de Deus também é escatológica e é nela que funda a segurança da nossa esperança. Por todo o Novo Testamento o que percebemos é o povo de Deus movido por essa expectativa escatológica e, de lá para cá, de tempos em tempos notamos essa percepção da graça de Deus sendo diminuída.
Se as promessas de Deus e seu cumprimento não fossem tão indissoluvelmente ligadas à Sua graça, então todos os incentivos da vida eterna após a morte iriam ter pouco conforto sobre nós ou mesmo nenhum. Em outras palavras, se Deus houvesse prometido aos seus eleitos a vida eterna, mas deixasse-nos a tarefa de alcançá-la, então não haveria nenhuma razão final que nos levasse a ter absoluta confiança de que poderíamos estar diante Dele no porvir. Então, realmente, que esperança haveríamos de ter na consumação não fosse sua graça uma garantia no passado, no presente e no futuro?
Certamente, sem a graça com seus efeitos também na consumação estaríamos envolvidos em um otimismo incerto, ou até mesmo em certo desespero.
É preciso – muito necessário mesmo – ter sempre em perspectiva o futuro maravilhoso que Deus tem preparado para nós, e a esperança da glória que nos será dada mediante a glorificação do corpo ressurreto para a vida eterna, conforme registra o apóstolo Paulo em Romanos 5.2: “Nós nos gloriamos na esperança da glória de Deus“.
O apóstolo Pedro, em sua primeira carta, registra:
“Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo que, segundo a sua grande misericórdia, nos gerou de novo para uma viva esperança, pela ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos, Para uma herança incorruptível, incontaminável, e que não se pode murchar, guardada nos céus para vós, Que mediante a fé estais guardados na virtude de Deus para a salvação, já prestes para se revelar no último tempo, Em que vós grandemente vos alegrais, ainda que agora importa, sendo necessário, que estejais por um pouco contristados com várias tentações, Para que a prova da vossa fé, muito mais preciosa do que o ouro que perece e é provado pelo fogo, se ache em louvor, e honra, e glória, na revelação de Jesus Cristo; Ao qual, não o havendo visto, amais; no qual, não o vendo agora, mas crendo, vos alegrais com gozo inefável e glorioso; Alcançando o fim da vossa fé, a salvação das vossas almas. Da qual salvação inquiriram e trataram diligentemente os profetas que profetizaram da graça que vos foi dada, Indagando que tempo ou que ocasião de tempo o Espírito de Cristo, que estava neles, indicava, anteriormente testificando os sofrimentos que a Cristo haviam de vir, e a glória que se lhes havia de seguir. Aos quais foi revelado que, não para si mesmos, mas para nós, eles ministravam estas coisas que agora vos foram anunciadas por aqueles que, pelo Espírito Santo enviado do céu, vos pregaram o evangelho; para as quais coisas os anjos desejam bem atentar. Portanto, cingindo os lombos do vosso entendimento, sede sóbrios, e esperai inteiramente na graça que se vos ofereceu na revelação de Jesus Cristo;” (1 Pedro 1.3-13)
Nesse registro de Pedro, no capítulo primeiro de sua primeira carta, encontramos que o Deus de toda graça chamou e chama Seu povo à sua eterna glória em Cristo, o perfeito, para confirmar, fortalecer e estabelecer. Esse é o chamado eficaz, esse é o chamado que regenera, que justifica, que resgatou e resgata os eleitos, que os converteu de seus maus caminhos. Mas não é só isso, a obra salvífica de Deus, para alcançar e salvar o povo do Seu pacto, era e é uma obra que pretende produzir glória eterna para Cristo. Nisso reside a glorificação, último ato da salvação.
Segundo Pedro nos ensina, uma legítima perspectiva da graça reside na glória! Ocorre que, se indagarmos a muitos cristãos de hoje, eles não se alegrarão com isso, nem com a volta gloriosa de nosso Senhor Jesus e a própria glória que nos será dada em Sua primogenitura. O que se assiste é cristãos pensando uma vida cristã cuja esperança tem seus limites em nossas experiências daqui, que abandonam a perspectiva da eternidade deixando de contemplar a maravilha do que está por vir por qualquer bocado de conforto mínimo aqui. Portanto, é necessário entender a relação entre a graça de Deus e a Glória porvir para que possamos viver confiantes em uma salvação que, tendo sido concedida a nós pela graça e poder de Deus, nos faz regozijar numa esperança clara e firme da herança que nos está prometida.
Quando falamos da graça, é preciso olhar para o passado e para o presente, mas, sobretudo, para o futuro e para a glorificação. Assim experimentaremos os significativos efeitos disso sobre nós, aumentando a esperança e qualificando a vida dos santos do Senhor. Veja a orientação de Pedro: “Cingindo suas mentes para a ação, mantenham-se sóbrios em espírito”(v.13) e continua a seguir: “esperai inteiramente na graça que se vos ofereceu na revelação de Jesus Cristo”.  Essa graça que nos é oferecida em Cristo é a promessa de uma herança eterna indestrutível, um futuro glorioso na presença de Deus, e deve ser essa a base de toda a nossa esperança, ser aquilo que orienta todo o nosso viver.
A nossa grande dificuldade tem sido pensar sobre o céu como o maior e o elemento culminante da graça. Graça e consumação são indissociáveis e, por alguma razão, não temos entendido isso!
Essa orientação das Escrituras tem profunda relação com o modo em que devemos viver nossas vidas. Paulo em Romanos 8.18 afirma: “Porque para mim tenho por certo que as aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser revelada.”
É certo, na demonstração de Paulo que, em meio a provações e sofrimento, é crucial que tenhamos uma perspectiva eterna, lembrarmos que os julgamentos temporais e as dores desta vida não podem sequer ser comparados com a glória futura que aguarda o povo de Deus e que o contrário disso nos levará a um conceito muito frágil e muito errado da graça de Deus.
É verdade que já vivemos, pela graça, os efeitos da implantação do reino dos céus naquilo que chamamos de “já e ainda não”, a aptidão dos dois estados com as circunstâncias do cristão é evidente. A graça passada e presente é parte do crente aqui; glória é a recompensa da graça futura. Uma é elemento essencial de sua condição atual, outra é sua condição futura. A Glória em sua plenitude não pode ser realizada na terra, visto que ela pertence a um estado perfeito do ser; e a graça não pode ser exercida no céu, visto que ela se refere ao pecado e à tristeza em suas formas infinitas. Ambas não fazem parte da nova ordem, estão, de maneira absoluta, ausentes dos novos céus e nova terra. Então, enquanto vivemos neste estado imperfeito do ser, somos sustentados, santificados e confortados pela graça, mas, quando somos libertos do fardo do pecado e a alma é despojada de suas vestes terrenas, a missão da graça é cumprida, a sua obra é completa e nós então somos recebidos acima na glória no estágio final da graça.
Portanto, todo crente deve viver ansioso pelo que a graça eterna vai fazer em sua vida. Deve ansiar pela graça futura. Deve se alegrar pela graça no passado. Regozijar-se pela graça no presente. Esperar,inteiramente, na graça a glória que lhe está reservada no futuro.
Neste ponto, ressaltamos que a graça é trinitária. Já assentamos a relação do pai e do filho anteriormente, agora é preciso dizer que é na habitação do Espírito Santo que o crente experimenta não apenas aspectos da graça presente, mas a graça futura, visto que promove os primeiros frutos da glória. Por isso que o apóstolo fala dos santos de Deus como tendo “as primícias do Espírito”.
Na visão que Paulo estabelece em Efésios 1, texto conhecido como os himalaias da Bíblia em razão de sua grande expressão doutrinária, podemos estabelecer o seguinte esboço:
                   – v. 3-6: O papel do Pai na salvação (passado)
                   – v. 7-12: O papel do Filho na salvação (tempo presente)
                   – v. 13-14 O papel do Espírito Santo na salvação (futuro)
O Pai planifica a redenção, o Filho a compra, e o Espírito a aplica.
A obra da salvação glorifica cada pessoa na Trindade, toda a divindade é glorificada na salvação de um pecador. Portanto, é pela economia da trindade que temos uma completa compreensão da graça. É na Trindade completa que somos completamente salvos, em todos os atos, do primeiro ao último. Nenhum deles baseado no pecador, em qualquer bondade ou merecimento, mas unicamente com base na graça de Deus e para a glória de Deus, o Deus que é infinito em merecimento.
A respeito da perseverança dos santos, Hoekema nos ensina que:
“O Espírito Santo está também indispensavelmente envolvido com nossa preservação ouperseverança na fé. Duas figuras bíblicas nos convidam a consideração: “selo” e “penhor”. O Espírito é o selo de nossa final redenção em Efésios 4:30: “E não entristeçais o Espírito de Deus, no qual [ou com o qual] fostes selados para o dia da redenção”. Nos dias do Novo Testamento um selo era usado como marca de propriedade; ser selado como Espírito significa ser separado como alguém que pertence a Deus. Nessa passagem, ser selado com o Espírito significa também que o Espírito nos guardará em comunhão com Deus até o dia final da redenção.”[1]
E prossegue adiante:
“Igualmente, em Efésios 1:13 e 14, Paulo encoraja-nos, dizendo: ” … Tendo nele também crido, fostes selados como Santo Espírito da promessa; o qual é o penhor da nossa herança até o resgate da sua propriedade … “. A palavra traduzida aqui por “penhor” [depósito de garantia], e arrabon, que também pode ser traduzida por “promessa”. Se temos o Espírito em nós, Paulo afirma, temos a segurança de que o futuro de glória, que é nossa herança em Cristo, será um dia nosso – nada poderá nos tirar essa herança!
A palavra arrabon, em relação ao Espírito, é usada em duas outras passagens.
Aprendemos de 2 Coríntios 1:22 que Deus “nos selou e nos deu o penhor do Espírito em nosso coração”. Ele nos deu seu Selo de propriedade e pôs um Depósito em nosso coração. Em 2 Coríntios 5:5 Paulo diz-nos que Deus, que está preparando para nos “um edifício, casa não feita por mãos, eterna, nos céus” (v. 1 ), outorgou-nos “o penhor do Espírito”. O Espírito Santo, em outras palavras, de maneira misteriosa – porém maravilhosa – habilita-nos a perseverar no caminho cristão até o dia quando entraremos na posse final da herança numa nova terra glorificada.”[2]
No mesmo sentido, ele afirma em seu livro a Bíblia e o Futuro, que:
“A palavra arrabon, como aplicada ao Espírito, portanto, enfatiza especialmente o seu papel na escatologia. Ela indica que o Espírito, que agora os crentes possuem é a garantia e penhor do complemento futuro de sua salvação ao no eschaton. Enquanto que a designação do Espírito, como primícias, indica a natureza provisória do gozo espiritual presente, a descrição do Espírito, como nossa garantia, implica a certeza do cumprimento derradeiro.[3]
Na última fase dessa salvação graciosa, os santos são fiéis, eles continuam na fé, eles perseveram na fé, essa é a ideia da doutrina clássica “Perseverança dos santos.” Essa frase consoladora aparece em Apocalipse 14.12: “Aqui está a perseverança dos santos, daqueles que guardam os mandamentos de Deus e a fé em Jesus.”. Que sofrem, mas continuam. E Efésios 1.3 afirma que essa bênção da perseverança é parte da graça e das bênçãos de Deus, que o Pai dá àqueles que Ele separou e fez santos que são fiéis. A preservação da graça de Deus é a bênção espiritual que precisamos para a perseverança na fé, por Sua preservação dos santos, Deus permitindo, capacitando, garantindo, eternamente garantindo a graça que nos mantém permanentes e perseverantes.
A definição dessa doutrina pode ser encontrada na Confissão de Fé de Westminster:
“Aqueles aos quais Deus aceitou em seu Amado, efetivamente chamados e santificados pelo Espirito, não podem, total ou finalmente, cair do estado de graça; eles certamente perseverarão ate o fim, e serão eternamente salvos.”
Essa doutrina da perseverança dos santos está expressa no Catecismo Maior de Westminster, do qual transcrevemos abaixo as perguntas 79 a 81:
Pergunta 79: “Não poderão os crentes verdadeiros cair do estado de graça, em razão das suas imperfeições e das muitas tentações e pecados que os surpreendem?
Resposta: Os crentes verdadeiros, em razão do amor imutável de Deus ( Jr 31:3; Jo 13:1) e do seu decreto e pacto de lhes dar a perseverança ( I Co 1:8; Hb 13:20 e 21; Is 54:10), da união inseparável entre eles e Cristo ( I Co 12:27; Rm 8:35-39), da contínua intercessão de Cristo por eles ( Hb 7:25; Lc 22:32), do Espírito e da semente de Deus que habitam neles ( I Jo 2:27), nunca poderão total e finalmente cair do estado de graça, mas são conservados pelo poder de Deus, mediante a fé para a salvação ( Jr 32:40; Jo 10:28)”.
Pergunta 80. Poderão os crentes verdadeiros ter certeza infalível de que estão no estado da graça e de que neste estado perseverarão até a salvação?
Aqueles que verdadeiramente crêem em Cristo, e se esforçam por andar perante Ele com toda a boa consciência, podem, sem uma revelação extraordinária, ter a certeza infalível de que estão no estado de graça, e de que neste estado perseverarão até a salvação, pela fé baseada na verdade das promessas de Deus e pelo Espírito que os habilita a discernir em si aquelas graças às quais são feitas as promessas da vida, testificando aos seus espíritos que eles são filhos de Deus.
I João 2:3; 1 Cor. 2:12; 1 João 4:13, 16 e 3:14,. 18-21, 24; Heb. 6:11-12; Rom. 8:16; 1 João 5:13; 11 Tim. 1: 12.
Pergunta 81: “Têm todos os crentes sempre a certeza de que estão no estado da graça e de que serão salvos?
Resposta: A certeza da graça e salvação, não sendo da essência da fé, crentes verdadeiros podem esperar muito tempo antes de consegui-la ( Is 50:10; Sl 68); e depois de gozar dela podem sentir enfraquecida e interrompida essa certeza por muitas perturbações, pecados, tentações e deserções ( Sl 31:22; Sl 73:1- 12; Sl 30:6, 7; Sl 51:8, 12); contudo, nunca são deixadas sem uma tal presença e apoio do Espírito de Deus, que os guarda de caírem em desespero absoluto ( Jó 13:15; Sl 73:13- 15)”.
Jesus disse: “Aquele que perseverar até o fim será salvo” (Mt 24). Deus também diz em Salmos 97:10: “Ele preserva as almas dos seus santos.” Uma certeza confiante, pela graça, a mesma que Paulo teve até o fim de sua vida está em 2 Timóteo 4.18: “… o Senhor me levará salvo para o seu reino celestial.” A confiança de Paulo era uma grande segurança da graça que havia lhe alcançado e que o levaria à glória final: “Quanto a mim, já estou sendo oferecido por libação, e o tempo da minha partida é chegado. Combati o bom combate, completei a carreira, guardei a féJá agora a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, reto  juiz, me dará naquele dia; e não somente a mim, mas também a todos quantos amam a sua vinda” (2 Tm 4.6, 7 e 8).
 J.C. Ryle, em seu livro Santidade, começa seu capítulo sobre a garantia com comentando estas palavras de Paulo:
“Nestas palavras das Escrituras, vemos o apóstolo Paulo olhando em três direções: para baixo, para trás e para diante. Para baixo, a sepultura; para trás, o seu próprio ministério; e para diante, aquele grande dia, o dia do juízo! Ficar ao lado dos apóstolos por alguns minutos e dar atenção às palavras por eles usadas nos faz bem. Feliz é a alma que pode olhar para onde Paulo olhou e, então, falar como ele!”[4]
E ele continua:
“Notemos que o apóstolo falou sem a menor hesitação ou senso de desconfiança. Ele reputava a coroa como algo já garantido, como algo que já lhe pertencia. Ele declara com inabalável confiança a sua firme persuasão de que o Justo Juiz haveria de entregar-lhe a coroa. Paulo não estranhava todas as circunstancias daquele dia solene. O grande trono branco, a humanidade inteira reunida, os livros abertos, o desvendamento de todos os segredos dos homens, os anjos como testemunhas, a temível sentença, a eterna separação entre os salvos e os perdidos. Com todas estas coisas ele estava bem familiarizado, porém, nem uma delas o abalava.
Sua poderosa fé saltava por cima de tudo, e ele via somente a Jesus, seu todo-prevalente Advogado, o sangue da aspersão e os pecados perdoados. Disse ele: “Uma coroa me está reservada”. “O próprio Senhor a entregará a mim” Paulo falava como se estivesse contemplando tudo com os seus próprios olhos.[5]

Esses são os efeitos da segurança das bênçãos trinitárias na salvação. Estar em Cristo é grande segurança porque ninguém pode arrancar-nos da sua mão, ou fora da mão do pai, como nos assegura João 10.27-29. Estar em Cristo, em união com Cristo, é a fonte de toda a segurança. Deus, o Espírito Santo é a mais completa e definitiva garantia para o crente, por sua obra dentro de nós.
Paulo, em Romanos 8.37-39, nos afirma que “em todas estas coisas somos mais que vencedores, por aquele que nos amou. Porque estou certo de que, nem a morte, nem a vida, nem anjos, nem principados, nem coisas presentes, nem futuras, nem potestades, nem a altura, nem a profundidade, nem qualquer outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor.”
A invencível e irreversível graça de Deus Pai e Deus Filho (Ef .:3-6) tem forte e perfeito apelo para fortalecê-la ainda mais (v. 13-14) somando à atuação da graça do Espírito Santo. Paulo traz mais esta afirmação gloriosa (v. 3-14) garantindo ainda mais bênção mediante a conclusão e culminação pela graça do Espírito Santo de selar e conferir segurança a tudo que Deus Pai e Deus Filho têm feito e não poderá jamais ser desfeito, porque Deus, o Espírito Santo pessoalmente, sela e assegura sua consumação.
Revisando Efésio 1.3-14, vemos que a Trindade é integralmente envolvida no processo de salvar os pecadores, garantindo-lhes a salvação. E isso Deus o faz completamente, do início até o fim, antes que houvesse o tempo (v. 4) e até o fim dos tempos (v. 10, 14). E, nesse contexto, o Espírito Santo oferece a graça de preservar a perseverança dos santos, assim eles vão ter firmeza até o fim.
Não é um poder do homem que o faz firme, mas o poder e a graça de Deus que preservam e mantêm aqueles que são verdadeiramente salvos, e para sempre salvos. É por isso e assim que os verdadeiros crentes perseveram. Devemos persistir até o fim, mas, no final, nossas obras não ganham ou mantêm nossa salvação, é a obra de Deus que nos salva e é a obra de Deus dentro de nós que demonstra que somos salvos.
A esse respeito comenta Anthony Hoekema que, se “deixados por si só, entregues a sua própria força, aos seus próprios recursos, eles indubitavelmente cairiam e perderiam sua salvação. Mas Deus não permite que isso aconteça aos que são seus, aos que ele escolheu em Cristo desde a criação do mundo (Ef 1.4) e que predestinou para serem conforme a imagem do seu Filho (Rm 8.29). Esse é o ponto mais importante; e realmente o cerne da doutrina. Os crentes perseveram apenas porque, em seu imutável amor, Deus os capacita a perseverar.”[6]
E depois continua: “Fica evidente, portanto, que o Reino de Deus, como descrito no Novo Testamento, não é um estado de atividade realizada por meio de conquistas humanas, nem a culminação de esforços humanos extenuantes. O Reino é estabelecido pela graça soberana de Deus e suas bênçãos devem ser recebidas como dons dessa graça.”[7]
Essa garantia bíblica não vem de nenhum de nossos atos passados, presentes ou futuros, mas baseia-se unicamente no que o Espírito Santo fez, está fazendo e fará em nós.
Assim é que a relação entre graça e escatologia bíblica não apenas afirmam nossa esperança na glorificação e na volta do Senhor Jesus inaugurando a nova ordem, mas também nos capacita a viver aqui coerentemente com essa expectativa. O evangelho da graça move o pecador justificado para um labor santo, a um amor ativo na promoção do reino que está se estabelecendo.

Esse é o espírito da pergunta 52 do Catecismo de Heidelberg:

52. Que consolo traz a você a volta de Cristo “para julgar os vivos e os mortos”?
R. Que, em toda miséria e perseguição, espero, de cabeça erguida, o Juiz que vem do céu, a saber: o Cristo que antes se apresentou em meu lugar ao tribunal de Deus e tirou de mim toda a maldição (1).
Ele lançará, na condenação eterna, todos os seus e meus inimigos (2) , mas Ele me levará para si mesmo, com todos os eleitos na alegria e glória celestiais (3).
(1) Lc 21:28; Rm 8:23,24; Fp 3:20; 1Ts 4:16; Tt 2:13. (2) Mt 25:41-43; 2Ts 1:6,8,9. (3) Mt 25:34-36; 2Ts 1:7,10.

E então? Qual o efeito de mudarmos nosso olhar para a graça na perspectiva da eternidade? Vimos que a vida eterna é um dom da graça. A glorificação é o ato final da graça. É a graça final em graça sobre graça. Em que medida essas verdades ancoram nosso viver, toda a nossa vida?
Tamanha imensidão da graça na perspectiva da consumação do pacto, da certeza da glória vindoura, deveria nos conduzir a viver de modo mais íntimo aquilo que é eterno, “as coisas do alto”, conforme a recomendação do apóstolo Paulo aos colossenses.
É preciso estar nesse mundo, mas viver como cidadão dos céus, sem obstáculos e interrupções na comunhão com o Senhor vivo. Experimentaremos isso, em toda a adoração, oração e serviço que prestamos, a cada suprimento da graça, se conscientes de que a glória de nossa preservação não pode ser comparada com a expressão avassaladora da glória eterna.
Pensar nas “coisas lá do alto” é viver na expectativa da graça futura e da glória que nos está prometida, seguindo a recomendação de Pedro, numa firme esperança da  graça final.
A viva expressão da esperança da glorificação passa também pelo anseio pela cidade eterna, conforme Paulo fala aos Filipenses no capítulo 3 e versículo 20: “Mas a nossa cidade está nos céus, de onde também esperamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo, Que transformará o nosso corpo abatido, para ser conforme o seu corpo glorioso, segundo o seu eficaz poder de sujeitar também a si todas as coisas.” Em Mateus 25, nosso Senhor, em uma expressão da grandeza dessa glória, disse em meio à parábola sobre os servos: “Entra no gozo do teu Senhor.” Essa é a característica dominante do céu, a plenitude de Deus, de alegria, de satisfação e da exuberância do nosso Senhor.
Diante de gloriosas verdades, que o nosso interesse ​​neste mundo seja na medida da glória do Deus da graça e para o avanço de Seu Reino e muito vago em relação a coisas triviais, e que eliminemos de nossas vidas as disposições contrárias e exultemos em aclamação da graça e da glória do nosso Deus:
Vou à pátria – eu, peregrino -,
A viver eternamente com Jesus,
Que concedeu-me feliz destino
Quando, ferido, por mim morreu na cruz.

Vou à pátria – eu, peregrino -,
A viver eternamente com Jesus!
Vou à pátria – eu, peregrino -,
A viver eternamente com Jesus!

Vou à pátria, vou à pátria – peregrino, peregrino -,
Com Jesus, com Jesus! Com Jesus viver!
Vou à pátria, vou à pátria – peregrino, peregrino -,
Com Jesus, com Jesus! Com Jesus viver!

Dor e pena, tristeza e morte
Lá no céu jamais o salvo encontrará!
E desfrutando de Cristo a sorte,
Eternamente a Deus exaltará.

Terra santa, formosa e pura,
Salvo por Jesus eu entrarei em ti;
Felicidade, paz e ventura,
Perfeitamente desfrutarei ali.
(HNC 193 – Aspiração do Céu)
Soli Deo Gloria!

[1] Anthony Hoekema, Salvos pela graça, p. 40.
[2] idem, p. 40.
[3] Idem, A Bíblia e o Futuro, p. 77.
[4] J. C. Ryle, Santidade, PES, p. 135
[5] Idem, p. 137.
[6] Anthony Hoekema, Salvos pela Graça, p. 226.
[7] Idem, p.58.
Autor:
Dilsilei Monteiro
Dilsilei Monteiro é Pastor Presbiteriano, Advogado e Mestrando em Teologia pelo Centro de Pós-Graduação Andrew Jumper. 

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Somente Cristo Justifica




Somente Cristo Justifica
Santo Agostinho
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto

A observação de Agostinho sobre a justificação é uma das mais importantes citações sobre o assunto antes do movimento da Reforma. “Pois assim como por uma só ofensa veio o juízo sobre todos os homens para condenação, assim também por um só ato de justiça veio a graça sobre todos os homens para justificação de vida” (Rm 5.18). Essa “uma só ofensa”, se somos tendentes à “imitação”, pode ser apenas a ofensa do diabo. 

Visto que, contudo, isso é manifestamente falado em referência a Adão, e não ao diabo, segue-se que não temos nenhuma outra alternativa, senão entender que o princípio da propagação natural, e não aquele da imitação, está aqui implícito. [XIV.] Ora, quando ele diz em referência a Cristo, “um só ato de justiça”,  ele tem declarado  mais expressamente  nossa  doutrina  do que se dissesse, “um só ato de retidão”; porquanto ele menciona aquela justiça pela qual  Cristo  justifica  o  ímpio,  e  a  qual  não  propôs  como  um  objeto  de imitação, pois ele somente é capaz de efetuar isso. Ora, era absolutamente apropriado  o  apóstolo  dizer,  e  diz  corretamente:  “Sede  meus  imitadores, como também eu sou de Cristo” (1Co 11.1); mas ele nunca poderia dizer:

“Sede meus justificados, como também eu sou por Cristo”; – visto que pode existir, e de fato realmente existem e têm existido, muitos que eram retos e dignos  de  imitação;  mas  ninguém  é  justo  e  um  justificador,  mas  Cristo somente. Portanto, está dito: “Mas, àquele que… crê naquele que justifica o ímpio, a sua fé lhe é imputada como justiça” (Rm 4.5). Ora, se algum homem tivesse em seu poder confiantemente declarado, “eu te justifico”, segue-se necessariamente que ele poderia dizer também, “creia em mim”. Mas nunca esteve no poder de nenhum dos santos de Deus dizer isso, exceto o Santo dos santos, que disse: “Credes em Deus, crede também em mim” (Jo 14.1); de forma que, visto que é ele quem justifica o ímpio, ao homem que crê naquele que justifica o ímpio, sua fé é contada como justiça”.

Fonte: Saint  Augustine's  Anti-Pelagian  Works, A
Treatise on the Merits and Forgiveness of Sins and on the
Bap, Book 1, Chapter 18.

Pregando como um moribundo, para moribundos


3 pilares da Reforma Protestante: sola Scriptura, sola fide, sola gratia;




Introdução:
• 3 pilares da Reforma Protestante: sola Scriptura, sola fide, sola gratia;
• Mesmo em forma de afirmação, cada pilar também é negação. Por exemplo, a expressão, sola Scriptura, é uma negação da preeminência da tradição da  igreja e um protesto contra o uso da tradição como uma norma para a fé de igual valor que a Bíblia. Por isso, somos fundamentalmente “protestantes” não porque descartamos o valor da tradição, mas porque entendemos que a autoridade das Escrituras é suprema em relação às nossas interpretações. A expressão, sola fide, nega a intermediação dos sacerdotes como necessário para se chegar a Deus, e enfatiza que este acesso é unicamente pela fé, isto é pela crença. Por isso assumimos o nome de “crentes”. E a expressão, sola gratia, nega as obras como mérito da salvação entendendo que o evangelho se revela a nós unicamente pela graça de Deus. Por isso, somos também conhecidos como “evangélicos”.

• Cada pilar também gera uma nova base para a igreja e a sociedade que esta influencia. A ênfase na autoridade das escrituras (sola Scriptura) lançou o movimento da tradução das Escrituras nas diversas línguas mundiais enquanto promoveu a alfabetização das suas inúmeras culturas e o sistema de educação moderna. A ênfase no sacerdócio dos santos (sola fide) corroeu definitivamente o governo da igreja e da sociedade que age de cima para baixa e contribuiu mais para o estabelecimento da democracia no mundo hoje que a filosofia grega aonde a idéia da democracia nasceu. Finalmente, a ênfase na graça e no evangelho de Deus (sola gratia) lançou nada menos que o movimento missionário moderno, que desde o século XVIII contribuiu mais para a transformação do mundo que qualquer outra filosofia ou religião poderia jamais esperar. Eu estou aqui hoje como missionário por causa do grito reformado de sola gratia, e a Igreja Presbiteriana Independente do Brasil, apesar da sua sola Scriptura independência inicial dos missionários estrangeiros, existe também hoje por causa do mesmo grito.

• Antes de todos estes princípios está o princípio protestante mestre (principium  theologiae): solus Christus.

• A minha pergunta hoje é esta: se este movimento transformou tanto, somos ainda os légitimos herdeiros deste movimento pela força da nossa diferença?  Ou como a Igreja Católica, somos meros promotores do status quo, sem sal ou luz neste mundo? Somos diferentes por causa do evangelho? Ou mantemos os mesmos valores que o catolicismo?

• 3 princípios nos distinguem. Queremos considerar um deles hoje à noite, o  princípio de sola Scriptura.

• Uma das características dum despertamento é a exposição ousada e transparente da Bíblia.
1. A pregação das Escrituras é a base dum despertamento duradouro. Por que? Cada  despertamento por definição provoca uma reação de “ahá!” , como quando finalmente conseguiu entender uma verdade bíblica que nunca conseguiu antes perceber. Já reparou que pessoas que procurem andar bem próximo de Deus tem muitos “aás” na sua caminhada? Por que? Porque a compreensão vem pela renovação e pelo Espírito de Cristo. 
Então Jesus disse para os que creram nele: - Se vocês continuarem na minha  Palavra, serão, de fato, meus discípulos e conhecerão a verdade, e a verdade  os libertará. João 8.31-32’

Em toda a história, sempre que a igreja se renova, ela vem a ter nova compreensão, ou uma compreensão renovada. Por isso somente as Escrituras podem ter a prioridade na interpretação da nossa fé porque somente as Escrituras despertadas na nossa vida pelo derramar do Espírito de Deus, podem desafiar a nossa orientação, às vezes certa em outra ocasião ou época. São as Escrituras, pela sua pregação, que desloca velhas idéias e a vozes humanas para deixar espaço para sola Scriptura o Espírito de Deus agir entre nós.

Lembram-se da hístória do profeta Samuel e o rei Saul”? O rei não conseguia receber a Palavra de Deus anunciada pela boca do profeta Samuel. Então Samuel recebia a desagradável incumbência seguinte...
Samuel respondeu: - O que é que o SENHOR Deus prefere? Obediência ou oferta de sacrifícios? É melhor obedecer a Deus do que oferecer-lhe em sacrifício as melhores ovelhas. A revolta contra o SENHOR é tão grave como a feitiçaria, e o orgulho é pecado como é pecado a idolatria. O SENHOR o rejeitou como rei
porque você rejeitou as ordens dele. - Eu pequei! - respondeu Saul.

Desobedeci às ordens de Deus, o SENHOR, e às instruções que você deu. Fiquei com medo do povo e fiz o que eles queriam.  1 Samuel 15.22-24 Saul perdeu a bênção de Deus e perdeu a sua posição dada por Deus porque não conseguia ser renovado através da palavra anunciada por Samuel. Jesus teve que lamentar, Assim vocês desprezam a palavra de Deus, trocando-a por ensinamentos que passam de pais para filhos. E vocês fazem muitas outras coisas como esta. Marcos 7.13.

Necessitamos das Escrituras, mas não secas e nuas, e sim, vistas por olhos renovados pela graça e pelo Espírito de Deus. Assim, o despertamento poderá fluir. O despertamento vem quando o povo de Deus consegue ouvi-la com uma nova clareza do Espírito Santo. Podemos ouvir? Quantos vezes já ouviu estas palavras?: Pois toda a Escritura Sagrada é inspirada por Deus e é útil para ensinar a verdade, condenar o erro, corrigir as faltas e ensinar a maneira certa de viver. 2 Timóteo 3.16.

As tuas leis são o meu prazer; não esqueço a tua palavra. Senhor, trata com bondade este teu servo, para que eu possa continuar vivo e obedecer à tua palavra! Salmo 119.16-17 Todos os que temem e obedecem ao SENHOR, escutem as suas palavras. Isaías 66.5a. Então Jesus disse para os que creram nele: - Se vocês continuarem a obedecer aos meus ensinamentos, serão, de fato, meus discípulos e conhecerão a verdade, e a verdade os libertará. João 8.31-32 A pessoa que é de Deus escuta as palavras de Deus. João 8:47a  A pregação das Escrituras é a base dum despertamento duradouro quando conseguimos ouvi-la.

2. A pregação das Escrituras serve tanto para encorajar quanto para corrigir. No dia de Pentecostes, Pedro se levantou e para explicar o que ocorrera, pregou um sermão baseado no Profeta Joel, mas centralizada em Cristo (Atos 2.16-36). Era uma mensagem desafiadora pedindo para toda a casa de Israel se definir em relação ao sacrifício e à posição atual de Cristo (veja também Atos 4.31, 33). A Bíblia diz que “muitos acreditaram na mensagem de Pedro”, deixando a entender que nem todos acreditaram (Atos 2.41; veja também v. 44). Pedro pregava com transparência, ousadia e definição clara sobre a fé em relação à obra de Cristo. Não podemos abrir mão da exposição transparente e ousada da Palavra de Deus. Paulo exortou Timóteo a insistir na pregação da Palavra “seja no tempo certo ou não. Procure convencer, repreenda, anime e ensine com toda a paciência” (2Timóteo 4.2). Esta é a natureza profética da pregação da Palavra.

A palavra de Deus é viva e poderosa e corta mais do que qualquer espada  afiada dos dois lados. Ela vai até o lugar mais fundo da alma e do espírito, vai  até o íntimo das pessoas e julga os desejos e pensamentos do coração delas.  Hebreus 4.12 .

Em outras palavras, o anúncio da Escrituras esclarece, não somente a mente, como também o coração e as intenções de outra sorte cobertas. O anúncio das Escrituras nos deixa transparentes diante de Deus.  Veja o caso do rei Davi diante da palavra profética de Natã: Por que é que você desobedeceu aos meus mandamentos e fez essa coisa tão horrível? Você fez com que Urias fosse morto na batalha; deixou que os amonitas o matassem e então ficou com a esposa dele! 2 Samuel 12.9  

Mas os que vivem de acordo com a verdade procuram a luz, a fim de que possa ser visto claramente que as suas ações são feitas de acordo com a vontade de Deus. João 3.21

As Escrituras desafiam nossa duplicidade escondida e exigem a integridade transparente. Temos a coragem de receber a Palavra de Deus? A pregação das Escrituras é incumbência especial da liderança da igreja.  A razão pelo surgimento dos diáconos em Atos 6 era de permitir que os apóstolos se dedicassem mais a pregação da Palavra de Deus. Expor corretamente a Bíblia era incumbência especial da liderança da igreja. Entre os  atributos da liderança da igreja em Tito 1.7-9, está o apego à Palavra fiel. Para um destes líderes, Paulo
foi bem claro.

Faça todo o possível para conseguir a completa aprovação de Deus, como um trabalhador que não se envergonha do seu trabalho, mas ensina corretamente a verdade do evangelho (“a palavra da verdade”, RA) 2Timóteo 2.15.

Ser corrigido pela pregação da Palavra é um dos maiores privilégios que nós na liderança gozamos. Preciso ouvir para ter autoridade para falar. Se não me corrijo, não posso corrigir os outros. Eu gostaria de poder dizer junto com o apóstolo: Nós não somos como muitas pessoas que entregam a mensagem de Deus como se estivessem fazendo um negócio qualquer. Pelo contrário, foi Deus quem nos enviou, e por isso anunciamos a sua mensagem com sinceridade na presença dele, como mensageiros de Cristo. 2Coríntios 2.1