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terça-feira, 15 de agosto de 2017

REVELAÇÃO E INSPIRAÇÃO

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A teologia cristã, como a Bíblia a apresenta, é uma unidade orgânica; e, como tal, deverá ser estudada, atendendo-se ao todo, e não a cada uma das partes em separado. Nenhuma doutrina poderá ser convenientemente estudada e aprofundada, sem a enquadrar-mos no sistema geral a que pertence. O nosso objetivo é, pois, tratar da revelação e da inspiração, de acordo com a doutrina bíblica. É necessário, no entanto, começarmos por distinguir esta doutrina das restantes verdades do Cristianismo. A doutrina da inspiração bíblica é, como veremos, uma parte da doutrina geral da revelação que, por sua vez, se baseia nas doutrinas fundamentais da criação e da redenção. Nas páginas que se seguem serão expostas estas diferentes relações, de maneira a compreendermos melhor a doutrina que se pretende inculcar.

I. A REVELAÇÃO

A palavra "revelação" pode ser tomada em dois sentidos: ativo e passivo. No primeiro caso significa a atividade de Deus, enquanto se dá a conhecer aos homens; no segundo, o conhecimento que lhes é comunicado. A idéia bíblica de revelação deve partir duma indução da evidência, para o que julgamos bastarão as páginas que se vão seguir.

a) O Velho Testamento

É freqüente o Velho Testamento afirmar que a existência e a história de Israel, como nação, e a sua religião como a Igreja, foram o resultado evidente da revelação divina. Deus revelou-Se na aliança efetuada com Abraão como seu Deus, comprometendo-Se a continuar essa aliança com a sua descendência (#Gn 17). Foi assim que os conduziu do cativeiro para a Terra Prometida, transformando-os num povo que passou a servi-Lo (#Êx 6.2-8; #Êx 19.3-6; #Sl 105.43-45). Deu-lhes a Sua "Lei" (torah, lit. "instrução"), e ensinou-lhes como deviam prestar-Lhe culto. Levantou uma série de intérpretes para lhes anunciarem "a Palavra do Senhor". Vezes sem conta e em momentos decisivos da sua história, esse Deus demonstrou o completo domínio que possuía das circunstâncias, revelando o que por eles iria fazer antes do acontecimento (cfr. #Is 48.3-7).

Israel tinha a consciência de ser o único povo a travar tais relações com Deus (#Sl 147.19-20), para quem a religião significava precisamente o conhecimento de Jeová, e supunha a revelação do Mesmo na aliança que fizera. A não ser assim, os gentios cairiam na idolatria. A religião revelada de Israel iria reparar as blasfêmias proferidas por outra religião qualquer. Por isso, quando Deus Se manifestou a outras nações, com quem não tinha efetuado qualquer aliança, foi exclusivamente para os julgar pelos seus pecados (#Êx 7.5; #Ez 25.11,17; #Ez 28.22-24).

O que o Velho Testamento supõe da Sua revelação é que não a considera total, perfeita, mas apenas preparatória para algo de maior. Os profetas anteviam aquele dia em que Deus iria revelar-Se de maneira mais prodigiosa com o aparecimento do Messias, que iria reunir o povo disperso e estabelecer o Seu reino entre os novos habitantes desse reino. Os céus e a terra renovar-se-iam (#Is 45.17-25); seria transformada a religião de Israel; enfim, todas as nações veriam e compreenderiam a glória de Deus em Israel (#Is 40.1-4; #Ez 36.23). É o que dá a entender o fecho do Velho Testamento (#Ml 4).

b) O Novo Testamento

Os escritores do Novo Testamento estavam convencidos de que só em Cristo se encontrava o significado da história judaica e do Velho Testamento. Por outras palavras, que o desenrolar dos acontecimentos em Israel, desde o seu início e através de todos os tempos, bem como a composição do Velho Testamento foram orientados por Deus, tendo em vista a encarnação. As deduções desta doutrina levaram, naturalmente, à idéia teológica fundamental pela qual se entende a revelação. A idéia é esta: Deus, Criador Onipotente, que "faz todas as coisas segundo o conselho da Sua vontade" (#Ef 1.11), previu a queda do gênero humano pelo pecado. Determinou, então, glorificar-Se através da Igreja; e, para isso, designou Seu Filho, que iria salvá-la, na qualidade de Ministro e Medianeiro de Deus. A história do mundo foi, e será sempre, nada mais nada menos que a execução do Plano divino, infalível sem dúvida, nos seus objetivos. Desde que o Filho de Deus apareceu para instaurar o Seu reino messiânico, foi enviado por Deus o Espírito Santo cuja missão no mundo era não só completar a revelação já começada na terra, em conformidade com os desígnios divinos, mas também, através da fé, conduzir o Seu povo à salvação prometida. A revelação do Plano de Deus era, pois, completada pelo Espírito, que o deu a conhecer aos apóstolos. Mas a plena execução só em Cristo se realizará com o Seu "aparecimento" (parousia), quando a Igreja obtiver a sua perfeição.

Esta é, a traços largos, a doutrina do Novo Testamento acerca da revelação. Embora mais explícita nas Epístolas Paulinas (cfr. #Rm 8.28-39; #Ef 1.3-14; etc.) e no Evangelho de S. João (cfr. #Jo 6.37-45; #Jo 10.14-18; #Jo 10.27-29; #Jo 16.7-15; 17), não é difícil notá-la mais ou menos em todos os livros, podendo ser reduzidos a três classes os principais textos que a eles aludem.

1. TEXTOS REFERENTES À PESSOA DE CRISTO-O Filho é a imagem do Pai (#2Co 4.4; #Cl 1.15; #Hb 1.3), sendo assim a perfeita revelação do Pai aos que têm olhos para ver (#Jo 1.18; #Jo 14.7-11). Toda a "plenitude" de Deus habita no Filho encarnado (#Cl 1.19; #Cl 2.9). Todos aqueles que compreendem o significado da vida e morte de Cristo, reconhecerão os desígnios ou "a sabedoria" de Deus relativos à salvação da Igreja (#Cl 2.2-3; #1Co 1.24; #1Co 2.7-10). Ninguém pode compreender a revelação sem uma luz espiritual vinda do alto (#Jo 3.3-12; #Jo 6.44-45; #Mt 16.17; #Gl 1.16).

2. TEXTOS REFERENTES AO PLANO DIVINO-O Plano divino para a salvação do Seu Povo escolhido, tanto judeu como gentio, era "o mistério", a divina "sabedoria", que Deus concebeu antes da criação, mas conservou oculta até ao tempo dos apóstolos. Só então veio a lume o verdadeiro significado da eleição e da história de Israel, e bem assim da revelação do Velho Testamento. A finalidade de Deus foi sempre, não a salvação de uma das muitas nações do mundo, mas a criação duma nova nação, cujos membros seriam recrutados de todas as outras, e passariam por um novo nascimento espiritual (cfr. #1Pe 2.9-10). Os regenerados seriam glorificados, tal como o seu Chefe ("as primícias" do novo povo, #1Co 15.20,23), de sorte que, ao chegar ao Céu no Seu corpo glorioso, fosse um penhor e uma garantia para os que um dia partilhassem com Ele dessa glória. Várias vezes Paulo alude à revelação deste mistério (#Ef 1.8-12; #Ef 3.3-11; #1Co 2.7-10; #Rm 16.25-26; #Rm 11.25-36; #2Tm 1.9-11). A fonte desta revelação é Deus; o Mediador, Cristo (#Gl 1.12; #Ap 1.1); o veio de transmissão, o Espírito Santo (#1Co 2.10-12; #2Co 3.15-18; #2Co 4.6; #Ef 3.5). Para que pudesse ser transmitido intato à Igreja, o Espírito inspirou as palavras do testemunho apostólico (#1Co 2.13), tal como inspirou as palavras de Cristo (#Jo 3.34; #Jo 12.48-50), de maneira a formarem um "corpo de doutrina" (typos; lit. "modelo" #Rm 6.17; #2Tm 1.13). Esta é, sem dúvida, a "sã doutrina" (#1Tm 1.10; 6.3; #2Tm 4.3; #Tt 1.9; #Tt 2.1), a "tradição" apostólica (#2Ts 2.15; #2Ts 3.6), a orientadora da fé e a vida das Igrejas.

3. TEXTOS REFERENTES À EXECUÇÃO DO PLANO DIVINO-Deus manifesta os Seus desígnios através de palavras e de ações; e cada uma destas ações, que marca um passo além no Seu Plano da história redentora pode chamar-se, apropriadamente, uma "revelação". O Novo Testamento conhece duas revelações deste gênero, que devem ainda realizar-se: a aparição do anticristo (#2Ts 2.3-8) e a parousia de Jesus (#1Co 1.7; #2Ts 1.7-10; #1Pe 1.7,13). Esta última encerra a história e precede o dia do Juízo Final. Cristo revelará, então, os eternos desígnios de Deus relativos aos impenitentes e aos santos, a manifestação da ira para aqueles e a glória para estes (#Rm 2.5-10; #Rm 8.18; #1Pe 1.5).

Tal é, em resumo, o material bíblico em que assenta a doutrina teológica da revelação.

c) A Revelação Original

A doutrina da revelação baseia-se no fato de Deus ter criado à Sua imagem e semelhança o homem, que O devia conhecer, amar, servir e glorificar. Para ser verdadeira, a religião do homem tem de ser baseada na revelação de Deus. Foi assim que Deus Se revelou a Adão, para que este vivesse em amizade com Ele. O primeiro conhecimento da Divindade, teve-o Adão através da restante criação, que acabava de sair do nada. O mundo que contemplava oferecia-lhe testemunho eloqüente do poder e da sabedoria do Criador. Não obstante a queda de Adão, (#Gn 3.18; #Rm 8.19-22), o Universo ainda proclamava a glória de Deus (#Sl 19; #Rm 1.19-20). E antes, como seria? Mais eficazmente, sem dúvida. Adão conheceu ainda Deus pelo conhecimento de si próprio, pois como mais nobre e mais perfeita criatura contribuía para revelar e proclamar mais alto a glória de Deus. A Providência divina deu-lhe ainda a conhecer a bondade do Criador. Se, apesar do caos que sobreveio ao mundo após o pecado, o decorrer dos acontecimentos ainda dá este testemunho (#At 14.17), o que não seria quando Adão só conhecia o paraíso, os animais que Deus lhe dera para dominar, e a esposa que criara para ele! (#Gn 2.18-24). Finalmente o testemunho das obras de Deus foi suplantado pela revelação verbal, quando necessária (embora não saibamos como transmitida) (#Gn 2.16-17).

Talvez não compreendamos devidamente esta doutrina. O conhecimento que Adão tinha de Deus no Éden, antes da queda, está tão fora da nossa compreensão, como o conhecimento de Deus que a Igreja gozará nos Céus depois da Ressurreição. Mas as características permanentes da auto-revelação divina merecem ainda mais algumas considerações:

1. A FINALIDADE DA REVELAÇÃO-Deus deu-Se a conhecer ao homem, a fim de que este atingisse o objetivo para que foi criado: para O conhecer, amar e adorar. O Criador é transcendente e inacessível às Suas criaturas, até ao momento que Se revele a elas; e o conhecimento que o homem tem de Deus é correlativo e conseqüente à primeira auto-revelação divina. Adão no Paraíso necessitava da revelação para viver em amizade com Deus.

2. OS MEIOS DA REVELAÇÃO-Revelação é a manifestação pessoal de Deus às Suas criaturas racionais. A afinidade que ela inicia é comparada, na Escritura, à do marido com a mulher, do pai com o filho, do amigo com amigo (cfr. #Jr 3; #Os 11.1; #Is 41.8; #Mt 7.11; #Jo 15.15; #Ef 5.25-27). Tal afinidade ou parentesco não poderia ser criado sem que Deus Se dirigisse pessoalmente ao homem. É Deus quem deve abrir-Se, quem deve falar. Agir sem uma explicação não é meio normal para se dar a conhecer. Adão não podia limitar-se em ver Deus apenas nas Suas obras; necessitava de O ouvir, de receber a Sua revelação verbal.

Certamente, revelação é mais do que uma simples informação comunicativa, tal como a fé é algo mais que o mero conhecimento das verdades. Nas revelações humanas as atitudes pessoais não podem, por natureza, exprimir-se duma forma verbal. Pode indicar-se a sua existência, definir-se-lhe a natureza, por meio da palavra, mas só através da ação, podem-se exprimir e manifestar devidamente. Por isso, quando Deus revela o Seu amor pela humanidade, o significado profundo contido nas palavras que pronuncia só será compreendido à medida que forem conhecidas as ações divinas. A atitude pessoal de Deus para com o homem requer, portanto, palavras e obras em matéria de revelação. O que importa, é frisar que dificilmente se pode admitir a revelação sem palavras.

3. A EFICÁCIA DA REVELAÇÃO-Que insondável mistério este, o de um Deus infinito dar a conhecer os Seus pensamentos ao homem, criatura mortal e finita! Não se imagine, todavia, que, de forma alguma, Deus é impedido na Sua ação reveladora por qualquer obstáculo humano. É certo, porém, que o conhecimento que o homem teve e tem acerca de Deus é imperfeitíssimo e, em muitos casos, não se adapta convenientemente ao seu objeto. Mas Deus, Criador da inteligência humana, preparou-a de maneira a poder compreendê-Lo perfeitamente no caso de lhe fazer qualquer revelação, sobretudo no que respeita à religião. Adão podia assim compreender Deus, quando Este Se dignasse revelar-Se-lhe. É assim que, ao manifestar-Se ao homem pecaminoso, Deus concede-lhe a faculdade de reconhecer a Sua Palavra e de a receber tal como é. Ao ato de confiança que resulta do exercício desta faculdade, dá a Escritura o nome de fé. Em #Hb 11.3 é a própria faculdade que assim é denominada. Pode-se, pois, afirmar que Adão no Paraíso tinha fé, e que quando o Espírito concede a faculdade da fé àqueles a quem Deus pretende dar-Se a conhecer, isto nada mais é que a restauração daquilo que o homem perdeu com a queda. Após a queda, o homem arriscou o seu estado primitivo e corrompeu a sua natureza. Deus adaptou-Se, por isso, à nova situação, integrando-o no processo redentor que logo iniciou, de maneira a remediar os efeitos do pecado. Mas os três aspectos da revelação, que notamos, ficaram e ficam constantes e firmes.

d) Deus revelou-se como Redentor Por causa do pecado o homem perdeu a possibilidade de apreender e compreender o testemunho que a criação dava de Deus. O significado e a mensagem do livro permaneceram os mesmos, mas ele é que não sabia lê-lo. E os Céus proclamavam a glória de Deus a ouvidos surdos. "Não se importaram de ter conhecimento de Deus" (#Rm 1.28). O homem deixou de amar e servir naturalmente o Criador, "porque a inclinação da carne é inimizade contra Deus" (#Rm 8.7). Apenas no coração lhe ficou uma ligeira idéia de Deus, isto é, uma noção de que havia algo ou alguém superior a ele, merecedor de que se lhe preste o devido culto; mas o homem não se dignou atribuí-lo ao seu criador. Sob a influência da descrença agora, contrariamente à Escritura que a condena, reina a cegueira e negação absoluta do verdadeiro Deus (cfr. #Rm 1.21-32; #Ef 2.2,3; #Ef 4.17-19).

Nestas condições é clara a insuficiência da auto-revelação na criação e da Providência de Deus. Mas Deus ainda Se manifesta nas Suas obras (#Rm 1.19-20), embora os homens fechem os olhos "detendo a verdade em injustiça" (#Rm 1.18). Ora, a continuação da revelação original não leva ao conhecimento de Deus e apenas serve para não se poder desculpar a ignorância do mundo. Supondo mesmo que o homem conseguisse ler bem "o livro das criaturas", essa leitura só e levaria ao desespero. Porque esta chamada revelação geral traz o conhecimento dum Deus que não admite mas castiga a desobediência e a ingratidão do homem (#Rm 1.18). Odiando, todavia, o pecado, Deus ama o pecador. Só o sabemos através duma revelação especial,  cujo centro é ocupado pela figura de Jesus.

Desde a queda que o Criador se deu a conhecer como Redentor, a surgir numa determinada época da história humana, mas sempre envolto naquilo que os apóstolos consideravam um "mistério". Todo o plano girava em torno da missão terrena do Filho encarnado. Em Cristo, apenas, se cumpriram todos os símbolos, figuras e representações a que aludem as profecias das Escrituras do povo de Israel (cfr. #Mt 5.17; #Lc 24.27; #Jo 5.39; #At 13.26-33; #Hb 7.10). É nesta missão que se baseia toda a atividade redentora de Cristo. Quando subiu ao Céu, por exemplo, o Senhor entrou na posse do Seu ministério celestial, de onde passou a conceder aos crentes, através do Espírito, as graças que prometera nesta terra, embora esse ministério só tenha o seu epílogo quando da segunda vinda de Mestre. Os desígnios de Deus a respeito da redenção, bem como a Sua plena e definitiva manifestação, só serão revelados quando a Igreja atingir a plenitude de perfeição, que lhe permitirá manifestar a glória de Deus (#Ap 21.11), e aparecer com o seu Salvador glorificado (#Ap 21; 22.5). Entretanto, continuará a manifestar-se a graça de Deus. A nova criação, por isso, tanto ou mais que a antiga, e a graça especial, tanto ou mais que a providência comum, são motivo de revelação, a manifestar mais uma vez a glória de Deus.

e) A revelação verbal

No âmbito da Redenção que abrange a salvação da Igreja, a revelação verbal tem um lugar primordial. Antes de nada mais, era um elemento importante na série de atos pelos quais a Redenção foi operada. Sem a revelação verbal nunca Abraão teria entrado em Canaã, nem Moisés conduzido Israel do Egito, e ainda a vida de Jesus teria corrido risco logo nos primeiros anos da Sua infância (cfr. #Gn 12.1-5; #Êx 3.6-13; #Mt 2.13-15). Em seguida, a revelação verbal foi sempre necessária como fundamento da fé. Neste aspecto salienta-se tal importância, sobretudo quando se analisa o significado soteriológico da fé. Como atividade, a fé não é só o instrumento que une o pecador a Cristo, mas, como faculdade, é o órgão daquele conhecimento e daquela amizade com Deus, outrora perdida, que pode, no entanto, reaver-se através da Redenção.

Ora, o objeto que movimenta esta faculdade é a Palavra de Deus como tal (cfr. #1Ts 2.13). A fé "ouve a Sua voz" e responde à Sua Palavra de promessa confiada e obedientemente. Sem uma palavra proferida por Deus, a fé não pode subsistir (#Rm 10.17). O motivo é evidente. Sem uma palavra de explicação, a obra redentora de Deus não seria facilmente reconhecida. Como vimos, sem se pronunciar, as intenções do Criador não poderão ser compreendidas pela criatura. O caso da encarnação dá a entender que a mais compreensiva das revelações divinas é a de mais difícil compreensão por parte do homem. Cristo, a Palavra de Deus em pessoa, realizou totalmente os desígnios redentores do Pai. Em Cristo, Deus manifestou-se claramente na Sua obra redentora, e por isso mesmo, o caso de Cristo transcende em absoluto o poder de interpretação do homem. "Não é de crer", escreve B. B. Warfield, "que a suprema revelação de Deus em Jesus Cristo fosse conhecida e compreendida, sem uma preparação, e esta sem ser acompanhada de revelações explicativas por palavras". Ainda não é tudo. Como poderíamos, sem ninguém no-lo dizer, acreditar numa verdade misteriosa e quase absurda, qual é a de Jesus-Deus encarnado, que veio a este mundo morrer numa cruz para resgatar o homem do pecado? Para crermos, outorgou Deus uma explicação verbal desse caso miraculoso do Homem-Deus, que vem a ser o evangelho, ou o kerygma dos apóstolos, a anunciar o dom de Deus da Palavra viva e das promessas de vida eterna aos que O receberem. Assim, parece que a revelação verbal relativa à ação redentora de Deus na história não é um mero apêndice a essa ação, mas parte integrante da mesma, como elo da cadeia de acontecimentos a que dizem respeito aquelas revelações. Se bem que o programa da redenção implique a salvação do homem, isso não basta. É necessário que os pecadores voltem à fé e ao conhecimento de Deus através do Evangelho, cujas promessas se mantêm idênticas em toda a história da redenção, desde Adão e Abraão até aos nossos dias, isto é, uma aliança em que Deus se prontifica a ser o Deus do Seu povo, Deus protetor e justo Juiz, não somente neste mundo mas também no outro, em especial para premiar os que n’Ele crêem e esperam. A fé salvadora tem sido a mesma, desde Abel até hoje (#Hb 11.4). Quanto ao seu conteúdo, porém, a promessa vai-se tornando cada vez maior. É que, adentro do plano dessa aliança, Deus vai revelando novas bênçãos particulares, já incluídas nesse plano, e o fundamento objetivo em que se baseia, que é a Sua obra redentora. É um processo que Deus vai utilizando sem cessar através dos séculos. Trata-se dum progresso, não no sentido de que cada nova revelação venha considerar a anterior como antiquada ou descabida, mas no sentido de que Deus vai ampliando aquilo que já ensinara, explicando aquilo que pretende fazer, até se aperfeiçoar o modelo da verdade que tem a sua plenitude em Cristo. Foi assim que, na devida altura enviou o Seu Filho para executar a Obra da Redenção, coroando em seguida o plano da revelação com o Evangelho. Em princípio, esse plano esteve sempre intimamente ligado ao plano de Deus acerca da história da Redenção. A cumular esse plano, a figura do Homem-Deus, Jesus Cristo.

A revelação verbal manifestou-se de múltiplas maneiras. Por vezes, casos anormais, como visões, sonhos, e a inspiração profética, que podia ir desde as mais prolongadas meditações aos arrebatamentos do êxtase. Noutros casos Deus servia-Se apenas do Seu divino concurso,  isto é, cooperando no exercício dos dotes naturais, e assim levando-os ao conhecimento da verdade através dos processos normais do pensamento: a investigação histórica, a exegese das Escrituras Canônicas, a meditação e a oração, o raciocínio lógico e teológico. Os livros históricos e da Sabedoria do Velho Testamento, bem como todo o Novo Testamento, exceto o Apocalipse, parece que supõem uma revelação deste gênero. Limitações do espaço não nos permitem tratar mais pormenorizadamente os diversos modos de revelação mas é importante notar antes de prosseguirmos que na Escritura não há indicação de diferença da integridade e pureza da revelação obtida por aqueles processos. Embora pareçam limitados em si mesmos, todos os órgãos de revelação são, na mão de Deus, um instrumento eficaz para o Seu desígnio.

f) A revelação bíblica

Deus quis deixar escrito aquilo que revelou. Mas o livro que escolheu para tal fim não contém todas as revelações verbais (cfr., por exemplo, a referência em #2Cr 9.29 aos livros proféticos que desapareceram), mas apenas as que se relacionavam com a finalidade do livro, que era não somente apresentar um fundamento para a fé pessoal e um guia para o crente, mas também permitir à Igreja que o compreendesse, que interpretasse a sua história, que reformasse e purificasse continuamente a sua vida e repelisse todos os assaltos, -quer lhe venham de dentro, pelo pecado e pela heresia, -quer de fora, pela perseguição e pelas ideologias rivais. Todos os problemas que a Igreja enfrentou, ou virá ainda a enfrentar, têm em princípio a sua resolução nas Escrituras. É porque a Bíblia, apesar de ser um livro humano, que fala de pecado e do erro e em muitos lugares da fraqueza dos seus autores, não deixa de ser, acima de tudo, uma obra divina, cujo autor primário é Deus.

Como prová-lo? Primeiramente pelo testemunho de Cristo e em seguida pelo testemunho de Espírito; sendo o primeiro uma prova externa, enquanto o segundo poderemos considerá-lo como uma prova interna. Examinemo-los:

1. O TESTEMUNHO DE CRISTO-Em primeiro lugar a autoridade de Cristo considera o Velho Testamento como inspirado por Deus. Trata-se dum testemunho firme e categórico, pois para Cristo a "Escritura" é uma unidade (cfr. #Jo 10.35), cuja autoridade, permanente e absoluta, supõe uma origem divina (cfr. #Mt 5.17-20; #Lc 16.17; #Mt 19.4-6). Os argumentos da Escritura são duma força extraordinária (#Mt 22.32,41 e segs.; #Jo 10.34,35). Quem não se apercebe da ênfase com que Cristo pronunciou aquele "está escrito"? Por isso todo o Seu ministério foi um testemunho contínuo a confirmar a autoridade divina do Velho Testamento, pregando e morrendo em obediência ao que estava escrito (cfr. #Mt 8.16,17; #Mt 26.24,54; #Lc 4.18-21; #Lc 18.31-33; #Lc 22.37). O Mestre, a quem a Igreja se submete, em tudo Se sujeitou à Palavra do Pai expressa no Velho Testamento. São os apóstolos os primeiros a confirmar tal testemunho (cfr. #2Tm 3.16; #2Pe 1.20-21; #Rm 3.2). Outros textos referem-se a palavras proferidas por Deus ou pelo Espírito Santo (cfr. #Mt 19.4,5; #At 4.25,26; #At 13.34-35; #Hb 1.6; #Hb 3.7).

Em segundo lugar a autoridade de Cristo supõe que o Novo Testamento tem o mesmo caráter do Velho. Jesus ensinou os discípulos a ler o Velho Testamento "cristologicamente", isto é, a considerá-lo como uma revelação profética de acontecimentos relativos a Si próprio (#Lc 24.24,25,44-45; #Jo 5.39,46). Os apóstolos assim procederam (cfr. #At 3.18,24; #1Pe 1.10-12), admitindo-o como se fosse escrito em primeiro lugar para beneficio dos crentes (cfr. #Rm 4.23,24; #Rm 15.4; #1Co 9.10; #1Co 10.11; #2Tm 3.16), ainda que só o poderiam vir a compreender os que o lessem à luz de Cristo (#2Co 3.14-16).

Ora, visto que Deus escrevera as Suas revelações proféticas para que pudessem ser continuamente acessíveis e duma forma inviolável para benefício, não só de Israel, mas também da Igreja Universal, preparou-as com tal sabedoria, que nada mais se poderia esperar senão o Novo Testamento para as cumprir. Há, no entanto, algumas considerações a fazer a este respeito. Em primeiro lugar, Cristo prometeu o Espírito aos apóstolos para que recordassem e compreendessem aquilo que já lhes ensinara (#Jo 14.25,26), e bem assim recebessem novas revelações, que Lhe diziam respeito, mas que eles ainda não podiam "suportar" (#Jo 16.12-14). Assim preparados, poderiam ser legítimos intérpretes do Mestre junto da Igreja, em todos os tempos e em todas as partes do mundo (#Jo 17.20; #Mt 28.19). Qual teria sido, pois, a intenção de Cristo, senão a de lhes impor a obrigação de deixarem por escrito esse testemunho que iriam perpetuar? Em segundo lugar, os apóstolos afirmam que, sob o impulso do Espírito Santo, ensinam e escrevem a verdade pura. É a inspiração verbal (#1Co 2.13), que só quem é "espiritual" pode compreender em toda a sua extensão e profundidade (#1Co 14.37; G1 1.8; #2Ts 3.6,14). O que não se pode negar é que os apóstolos exigiam para as suas obras uma autoridade tão categórica, como a que atribuíam ao Velho Testamento. Em terceiro lugar, veja-se como Paulo cita Deuteronômio juntamente com Lucas, e como Pedro se refere às epístolas paulinas, como parte integrante do Cânon das Escrituras (#1Tm 5.18; #2Pe 3.16). Finalmente, diversos séculos de exegese cristã demonstraram que, sob o ponto de vista teológico, os dois Testamentos formam uma unidade orgânica, que se completam mutuamente num harmonioso testemunho a Cristo.

Concluindo, seja-nos lícito afirmar que, à luz da intenção evidente de Cristo de escreverem os apóstolos os seus testemunhos, a autoridade que eles para si e para os outros reclamam, levam-nos, sem dúvida a admitir, que o Novo Testamento veio completar o Velho.

2. O TESTEMUNHO DO ESPÍRITO-Se é pelo uso da faculdade da fé que distinguimos a Palavra de Deus por aquilo que ela é, deve ser também a fé que vê a natureza real daquilo que contempla. Assim o interpretou a Igreja através dos tempos. Já que é o Espírito que infunde a fé, operando no íntimo dos crentes, a presença desta convicção é o que se chama o testemunho do Espírito.

A Bíblia é, pois, a Palavra de Deus revelada aos homens, enquanto nessas páginas Deus manifesta as Suas intenções relativas aos planos que traçou para salvação do Seu Povo. Chamar à Bíblia uma narrativa ou um testemunho é pouco, porque é muito mais. É uma narrativa, sim, não só daquilo que Deus disse, mas também daquilo que Deus ainda diz presentemente. É um elo na cadeia da ação redentora de Deus. O seu conteúdo, lido ou ouvido, é o meio pelo qual os pecadores chegam ao conhecimento do Pai e do Filho, baseados no ministério histórico de Cristo, que ele lembra e explica, e através da ação regeneradora do Espírito, que opera com a Palavra. Não é, todavia, a Palavra de Deus, no sentido em que cada frase separada, incluindo as palavras proferidas pelos perversos, exprime a intenção de Deus ou reflita a Sua divina vontade. A Bíblia é a "Palavra de Deus Escrita", mas considerada no seu todo, ou, com mais precisão, a teologia da Bíblia é uma unidade orgânica, que os nossos antepassados tão sugestivamente denominaram "corpo da divindade". Aqui se encontra a imagem da mente Divina, a transcrição dos Seus pensamentos, a declaração da Sua graça, a personificação verbal de todos os tesouros de ciência e sabedoria ocultos no Seu divino Filho. Aqui assenta toda a nossa fé.

II. A INSPIRAÇÃO

a) O significado da inspiração

A palavra inspiração, não sendo bíblica, significa, normalmente, uma influência sobrenatural do Espírito de Deus sobre os autores bíblicos, garantindo que, aquilo que escreveram era precisamente o que Deus pretendia que eles escrevessem para a transmissão da verdade divina, podendo, por isso, dizer-se realmente "inspirados" ou theopneustos,  literalmente, "soprados por Deus" (#2Tm 3.16). Como já não é novo para nós este assunto, limitar-nos-emos agora a corrigir alguns equívocos.

A "inspiração" que garante a comunicação infalível da verdade revelada é bem distinta da "inspiração" do artista criador. Nada de confusões. A inspiração não só não implica estado anormal do espírito do escritor, -por exemplo, visões ou audição de vozes estranhas, -como não supõe, também, a aniquilação da sua personalidade. Deus providencialmente preparou os meios humanos de inspiração para que os escritores pudessem cumprir a sua tarefa; e, na maior parte dos casos, apenas através das faculdades normais. Muitos estados de espírito são na realidade compatíveis com a inspiração. Não é necessário supor-se que os autores tinham sempre a consciência de que estavam a ser inspirados, quer dizer, que sabiam estar a escrever as Escrituras Canônicas. Nem há razão para afirmar-se que um documento inspirado não possa, na providência divina, ter sido compilado ou extraído de fontes por um processo vulgar de composição histórica, passando por várias edições até atingir a sua forma definitiva. O que deve admitir-se é que no fim de contas a obra foi theopneustos,  e que através dela Deus quis comunicar aos homens a Sua graça salvadora. Sendo assim, só podemos admitir a inspiração verbal. E se as palavras da Escritura são inspiradas por Deus, é quase uma blasfêmia não admitir a infalibilidade da sua doutrina, e a ausência de erro nessas palavras. São prerrogativas que não podemos aprovar, ou desaprovar, através da argumentação vulgar; porque as consideramos artigos de fé, baseadas que são na doutrina de Cristo e no testemunho do Espírito a confirmarem que as Escrituras Canônicas foram inspiradas por um Deus que não pode mentir. Quem as nega rejeita o testemunho de Cristo, dos apóstolos e da própria Igreja Cristã relativo à natureza da "Palavra de Deus" escrita, e com certeza não possui nem compreende o testemunho interno do Espírito Santo.

b) O problema da inspiração

Nenhuma doutrina cristã está isenta de problemas, e isto porque Deus quis que a Sua verdade fosse um objeto de fé. Ora, o fundamento da fé é o testemunho e a autoridade do próprio Deus; donde se segue que são coisas distintas o acreditar numa autoridade e o acreditar em face duma demonstração racional. O pecado original do homem foi um desejo de evidenciar a sua sabedoria auto-suficiente, uma vontade de não admitir qualquer autoridade externa, capaz de agir por si própria (cfr. #Gn 3.5,6); e Deus deliberadamente apresenta a verdade salvadora aos pecadores e de tal forma que, ao aceitá-la, supõe-se um ato de arrependimento intelectual de sujeição à doutrina de Deus. Daí a renúncia à própria sabedoria (cfr. #Rm 1.22; #1Co 1.19-25) a fim de que só possa sobressair aquela outra sabedoria, que é apanágio dos que ouvem a Palavra do Senhor. Para ser mais completa essa renúncia, Deus determinou, ou melhor, garantiu, que nem um só artigo de fé pudesse ser demonstrado, tal como qualquer teorema geométrico. O homem deve contentar-se com o conhecimento que adquire pela fé, conhecimento esse que, no fim de contas, jamais poderá atingir a perfeição neste mundo. Não conseguiremos, pois, eximir de dificuldades a doutrina da Inspiração Bíblica, tal como sucede com a doutrina da Trindade ou da Encarnação. Nem esperemos neste mundo resolver todos os problemas. Não é de admirar, portanto, que muitos cristãos caiam na heresia, a respeito desta ou doutras doutrinas. Convém, no entanto, indicar qual a atitude a tomar perante os erros que se nos apresentem.

Em primeiro lugar, esta doutrina não raro é amesquinhada por aqueles que dizem professá-la, e afirmam que a Bíblia é produto da inspiração em certo sentido, mas nunca inspiração verbal. Deus inspirou ou revelou a verdade aos escritores, que sendo criaturas falíveis e pecaminosas, poderiam falsificá-la. Por isso, é possível admitirmos erros nas Escrituras. Mas não foi assim, como vimos, o pensar de Cristo e dos apóstolos. É errado o pensamento de que nem todos os livros da Bíblia estão ao mesmo nível de profundidade espiritual e finalidade de doutrina; mas, na Sua providência soberana, podia Deus preparar e dirigir os instrumentos humanos apenas para escreverem precisamente aquilo que entendesse, nem mais nem menos. Por outras palavras, segundo esta teoria, a Bíblia não é aquilo que Deus pretendia, nem aquilo que Cristo pensava e ensinava. É evidente que tal teoria é inadmissível.

Em segundo lugar, rejeita-se por vezes a nossa doutrina, recorrendo-se a pretensos argumentos internos da Bíblia. Tais objeções, todavia, supõem fundamentalmente uma idéia humana a priori daquilo que provavelmente será a Bíblia inspirada. E, só o fato de as apresentar como argumentos válidos para duvidar do que Deus afirma desse livro, é já um sinal de impenitência intelectual, inconsciente talvez, mas não menos real por isso. O melhor é, na realidade, começar por aceitar o testemunho de Deus sobre a inspiração verbal, e só depois examinar os argumentos internos da Escritura para se chegar à conclusão da probabilidade da inspiração verbal. Por mais rigoroso e profundo que seja o exame, verificar-se-á que a inspiração se adapta perfeitamente a todas as formas do pensamento, a todos os métodos literários, a todas as figuras estilísticas e a todas as características vocabulares dos escritores. Estes são os canais condutores da verdade inspirada. Desconhecê-los, pode ser um perigo, pois é possível não se conhecer a intenção de Deus, e nesse caso descobrir erros onde na realidade não existem. Ao estudar-se a Bíblia, deve seguir-se o princípio, baseado na fé, de que a Escritura, em parte alguma é capaz de adulterar a verdade, sendo inspirada para no-la transmitir, e de que todos os acontecimentos bíblicos têm um significado que só a Igreja pode conhecer perfeitamente. Neste caso, é conveniente apreciar o texto a analisar à luz do contexto bíblico da Escritura, considerada no seu todo. Trata-se dum princípio de importância fundamental para a interpretação bíblica, que nunca se deve perder de vista, mesmo no meio das dificuldades que possam surgir a este respeito. Vamos citar aqui um exemplo apenas.

Várias vezes se diz que certas atitudes, ações e reflexões teológicas são uma refutação da doutrina duma Escritura inspirada. É uma objeção que só revela incompreensão da natureza da Bíblia. Já frisamos que a Bíblia é mais do que um simples amontoado de textos separados; é um organismo, um conjunto homogêneo, cujas partes não se podem explicar isoladamente. Ora, Deus recolheu diferentes materiais para a Sua obra; por isso não admira, que muitos dos exemplos apontados sejam maus. É que tudo serve para nossa instrução, embora tais exemplos possam ser interpretados de diferentes modos. Fala-se em erros teológicos e práticos, supondo-se que pelo fato de aparecerem na Bíblia têm a aprovação de Deus. Os princípios da teologia bíblica devem interpretar os fatos da história e da biografia bíblicas, uma vez que estes também explicam aquela. A Escritura interpreta-se com o auxílio da mesma Escritura. Já se disse que a Bíblia constitui uma unidade orgânica, que a Palavra de Deus é um todo, e que cada texto deve ser compreendido à luz da verdade que se encontra em Jesus.

Impossível aqui apresentar mais argumentos a favor da nossa tese. Limitar-nos-emos a afirmar, em conclusão, que a atitude da fé para com a doutrina da inspiração bíblica, bem como para com outras doutrinas, é a de aceitar única e simplesmente o testemunho de Deus. Nada, por isso, poderá abalar a nossa fé, já que nada pode abalar o testemunho em que se apóia. Quando tiver de enfrentar as dificuldades e as objeções, que implicam com a sua fé, o crente deve lembrar-se mais da sua possibilidade de falhar do que da infalibilidade do testemunho de Deus, ao apresentar-nos a verdade. Recorra-se, nesse caso, a uma cuidadosa retrospecção à luz dum estudo mais profundo e mais eficaz da evidência bíblica. Foi assim que se fizeram progressos doutrinários através da história da Igreja. Será assim que também nos nossos dias se conseguirá uma compreensão mais fiel e mais perfeita da doutrina da inspiração da Bíblia, aceitando-a como a Palavra de Deus, isenta de erro e infalível.


J. I. PACKER

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