René Padilla
Basta um estudo superficial de como Jesus desenvolveu seu ministério terreno para comprovar que para ele todas as necessidades humanas eram uma oportunidade de serviço. Nos Evangelhos não há a menor evidência de que ele pusesse as necessidades espirituais acima das corporais nem estas acima daquelas. Segundo o testemunho de Mateus, “percorria Jesus todas as cidades e aldeias da província da Galileia, ensinando nas sinagogas deles, e pregando o evangelho do reino, e curando todas as enfermidades e moléstias entre o povo” (9.35).
Seu ensinamento, de um alto conteúdo ético, se resume no Sermão do Monte (Mt 5–7) e deixa claro que o que Deus requer de seus filhos não se limita a deveres religiosos na área da relação com ele, mas se estende a todos os aspectos da vida humana, sem exceção. Além da relação com Deus, abarca a relação com o próximo e com a criação de Deus. Como sugere o Pai-Nosso, se orienta para “o cumprimento da vontade de Deus na terra” da mesma maneira como essa boa e soberana vontade se cumpre no céu. O ministério de Jesus inclui, portanto, o ensino da lei de Deus e dos valores do reino: paz, justiça, reconciliação, atitude em relação aos bens terrenos.
Vinculada estreitamente com o ensino, “a proclamação do reino de Deus” é um aspecto essencial do ministério de Jesus. Com efeito, o estudo deste conceito nos Evangelhos nos permite afirmar, sem medo de errar, que este foi o tema fundamental da pregação de Jesus. Não é à toa que a expressão reino de Deus (ou seu equivalente “reino dos céus”, no Evangelho de Mateus) se repete com tanta frequência nos Evangelhos. O de Marcos capta a importância desta proclamação quando resume as boas novas anunciadas por Jesus nestes termos: “O reino de Deus está próximo. Arrependei-vos, e crede no evangelho” (1.15b). Em um ambiente de expectativas messiânicas, como o que reinava entre os judeus naquele tempo, Jesus anuncia o cumprimento das profecias do Antigo Testamento. Não em termos do advento de um messias conquistador que vem libertar a nação de Israel de seus opressores, mas sim em sua própria pessoa e obra. Ele é o rei-servo que veio para estabelecer um reinado de paz e justiça! Como ele mesmo afirma no sermão inaugural (baseado em Isaías 61.1-2), na sinagoga de Nazaré da Galileia, no começo de seu ministério, referindo-se ao Messias enviado por Deus para anunciar boas novas aos pobres, proclamar liberdade aos cativos, dar vista aos cegos, por em liberdade os oprimidos e pregar o ano aceitável do Senhor: “nele se cumpre esta Escritura” na presença de seus ouvintes. E estes experimentam a presença do reino em suas vidas, na medida em que respondem a ele em arrependimento e fé.
O ensino e a proclamação do reino de Deus são acompanhados pela ação de Jesus em termos de “cura de toda enfermidade e de toda dor”. Os quatro Evangelhos demonstram essa maravilhosa liberação de poder milagroso em resposta às necessidades corporais de multidões submetidas à pobreza, sobretudo na província da Galileia. É óbvio que para Jesus o corpo humano não é menos digno de atenção e cuidado que o espírito.
Se algo está claro a partir da descrição do ministério de Jesus é que para ele a unidade do ser humano é uma premissa fundamental e, consequentemente, a missão de Deus aponta para a restauração da totalidade da pessoa em comunidade, segundo o propósito que estabeleceu originalmente na criação. Assim, hoje tomamos parte nisso como continuadores da missão integral de Jesus, na medida em que orientamos nosso ministério para a satisfação de necessidades humanas de pessoas indivisíveis.
Traduzido por Wagner Guimarães
C. René Padilla • é fundador e presidente da Rede Miqueias, e membro-fundador da Fraternidade Teológica Latino-Americana e da Fundação Kairós. É autor de O Que É Missão Integral?.
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