Texto base: Is 58.1-18, e Tiago
2: 14-26
Entramos agora na última das três
seções principais desta grandiosa segunda parte do livro de Isaías, e o tema é
o que poderíamos esperar. Tendo falado no propósito eterno de Jeová, de dar paz
ao Seu povo, e havendo revelado Aquele mediante o Qual ela pode ser obtida, o
Servo do Senhor, o Príncipe da Paz, o profeta demonstra agora o tipo de vida
que deve caracterizar os que foram admitidos à comunhão deste dom. Assim, o
assunto é agora essencialmente "o programa da paz".
Os capítulos 58 e 59 constituem
um "andamento" no tema. O primeiro refere-se à verdadeira e à falsa
adoração de Jeová, abordando assuntos como o jejum e o sábado. O capítulo 59
verbera os grosseiros pecados do povo, chamado à confissão penitente e ao lugar
onde se encontra o livramento e a absolvição. O profeta é encarregado de
declarar ao povo de Deus a sua transgressão e pecado. Censura-o severamente por
observar o ritual da religião sem, de forma alguma, produzir os frutos desta.
Repudia o valor de uma atitude humilde e contrito perante Deus quando, afinal,
no seu trato com os seus semelhantes, se descortinava ausência de compaixão e
justiça. Só abandonando os seus caminhos pecaminosos e impregnando de vida os
seus cultos é que encontrariam o poder e graça do seu Deus e as bênçãos
nacionais outorgadas pelo concerto firmado na antigüidade.
Desta forma será demonstrado que
Deus não mudou numa meditação neo testamentária em Tiago, donde será
demonstrado a prática da fé cristã.
I. O JEJUM SEM ARREPENDIMENTO E
REFORMA É HIPOCRISIA (#Is 58.1-12). O povo queixa-se de que os seus jejuns não
lhe trouxeram quaisquer benefícios materiais, e é-lhe dito em resposta que o
jejuar em tais condições não passa de um fingimento oco. Observava-se o ritual
do jejum, mas faltava por completo a verdadeira abnegação do ministério do amor
(1-5). Se lograssem reencontrar o verdadeiro espírito da religião, seriam
erguidos a um nível superior de vida-a vida planeada e abençoada por Deus
(6-12).
Clama em alta voz, não te
detenhas... anuncia ao Meu povo a sua transgressão (1). É esta a acusação que o
profeta tem de transmitir, uma mensagem de condenação. Todavia, Me procuram
cada dia (2); existia uma fachada externa de religião, mas o seu coração andava
longe de Deus; os pretensos adoradores procuravam-se apenas a si próprios em
tudo quanto faziam. Porque jejuamos nós? (3). É o coração em toda a sua
realidade que aqui se revela. Julgavam ir merecer a aprovação de Deus meramente
em virtude dos seus jejuns. Achais o vosso próprio contentamento (3), isto é,
prosseguis nos vossos negócios e fazeis as coisas de tal modo que os vossos
servos estejam rigorosamente ativos durante esta hora de suposta devoção. Eis
que para contendas e debates jejuais (4). Os dias de jejum, afinal, eram dias
de contendas e dissídios. Para fazer ouvir a vossa voz no alto (4), isto é,
jejuns como os vossos não são os que farão com que as vossas orações sejam
ouvidas no trono da graça. Seria este o jejum que Eu escolheria? (5). O mero
ascetismo nada é. O que dá vida a isto, como a tudo o mais, é o espírito. Segue
se no versículo 6 uma definição do tipo de jejum que Deus exige. Libertação de
escravos, remissão de dívidas, distribuição de bens entre os necessitados, e
outros atos semelhantes, eis o que agrada a Deus e acarreta a Sua graciosa
bênção. Não te escondas da tua carne (7), isto é, dos teus parentes. Não os
deveriam evitar, mesmo que fossem pobres e necessitados. O estender do dedo (9),
isto é, apontar com o dedo para alguém, sinal do amargo desprezo.
II) FÉ E OBRAS Tg 2.14-26
Este parágrafo é o ponto crucial
da epístola e contém declarações que têm dado lugar a infindáveis debates na
Igreja. Foi este parágrafo que levou Martinho Lutero a proferir sua famosa
crítica, quando chamou esta carta "epístola de palha". Mas a
declaração do apóstolo em seu conjunto é eminentemente razoável. Procura ele
mostrar a diferença que há entre uma fé viva e ativa, e a que existe apenas no
nome. "Meus irmãos, qual é o proveito se alguém disser que tem fé, mas não
apresenta obras? Pode, acaso, semelhante fé salva-lo?" (Moff.). Não há
antagonismo aqui entre o ensino de Tiago e o de Paulo. Este ensina que a
justificação diante de Deus não é nunca pelas obras da lei, mas pela fé em
Cristo (#Rm 4.1-5.2). O apóstolo vê necessidade de frisar isto ao procurar
orientar os que pensam que, pela guarda da lei, podem achar a salvação. Ao
mesmo tempo ele daria todo seu apoio à alegação de Tiago de que a fé que não Se
exterioriza na vida prática e na conduta, não passa de consumada zombaria, e
que ninguém é justificado perante Deus que ao mesmo tempo não seja justificado
praticamente perante os homens (ver #Tt 1.16; #Tt 3.7-8). A fé, sendo a raiz,
deve naturalmente dar origem as obras, que são os frutos. Tiago precisa dar
ênfase a este lado da questão, visto que a situação por ele enfrentada é quase
oposta àquela de que Paulo trata nos primeiros capítulos de Romanos.
Para ilustrar o seu ponto, Tiago
figura a conduta impiedosa de quem despede companheiros cristãos tiritantes de
frio e famintos, dizendo-lhes apenas "Desejo que passeis bem; aquentai-vos
e alimentai-vos bem" (16, Wey.), e deixa de lhes prover às necessidades
corporais. De que vale a fé que presencia tais sofrimentos e não se dispõe a
acudir-lhes benevolamente? Tiago presidia a Igreja de Jerusalém que sofrera (e
provavelmente naquela época ainda estava sofrendo) em conseqüência da fome
predita por Ágabo (ver #At 11.28-30). Podia então falar de experiência própria.
"Votos de Felicidade" é uma frase oca, a não ser que a pessoa que os
formula concorra para isso (Plauto). De que servem meras palavras
desacompanhadas da prática da misericórdia? Crença religiosa, mesmo que seja
ortodoxa, que não resulta em ação, é morta, porque lhe falta poder. O mero
assentimento a um dogma nenhum poder tem para justificar ou salvar (cfr. #Rm
2.13). "Ninguém é justificado pela fé, a menos que esta o faça
justo".
>Tg-2.18
Tiago enfrenta agora uma possível
objeção. Supõe o caso de alguém a argüir. Tu tens fé e eu tenho obras:
mostra-me essa tua fé, sem as obras, e eu, com as obras, te mostrarei a minha
fé (18). Então declara, de modo prático, que a pretensão de ter fé,
independente de obras de caridade ou misericórdia, é inteiramente vã; porque
visto como a fé não pode ser discernida senão por seus efeitos (isto é, boas
obras), segue-se que a pessoa cuja vida não produz boas obras presumivelmente
não tem fé.
Diariamente, pela manhã e à
tarde, os judeus piedosos recitavam o Shema, cujas palavras iniciais são,
"Ouve, ó Israel, Jeová nosso Deus, Jeová é um". Este monoteísmo era
um artigo fundamental do credo. Mas apenas assentir nele sem que daí
resultassem obras, isso não levava ninguém acima do plano dos demônios, os
quais também crêem no mesmo fato. A crença dos demônios evidentemente não tem
valor; eles estremecem quando pensam em enfrentar o Deus único em juízo. Tal
fé, que pode ser descrita como simples crença intelectual, não é a fé que
salva.
Tiago não leva para diante seu
arrazoado, mas escarnece ligeiramente do homem insensato. O adjetivo no grego é
kenos, que significa "vazio", sugerindo o devoto insensível, de
cabeça oca, de uma religião de mero formalismo. E prossegue dando dois exemplos
de justificação, tirados do Velho Testamento. Primeiro chama atenção para nosso
pai Abraão (21; cfr. #Gl 3.6-7), que foi justificado pelas obras, quando, em
inteiro devotamento e obediência incondicional à ordem de Deus, ofereceu Isaque
(ver #Gn 22). Tiago e Paulo concordam que foi quando Abraão creu em Deus, que
isto lhe foi imputado para justiça (#Gn 15.6), isto é, foi justificado pela fé
perante Deus. Porém, quando pela fé ofereceu Isaque no altar, foi justificado
pelas obras perante os homens, visto como demonstrou com isso a realidade de
sua confiança em Deus. Amigo de Deus (23); foi esta a caracterização mais alta
que já se fez de uma pessoa. Deus admitiu Abraão em Sua intimidade, nada lhe
ocultando (#Gn 18.17), e sobre ele derramando as mais excelentes bênçãos.
Evidencia-se deste exemplo que a fé de Abraão não foi mera crença na existência
de Deus, e sim um princípio que o levou a confiar nas promessas divinas, a agir
pela vontade de Deus, a amar e a obedecer a essa vontade. Suas obras
justificaram-lhe a fé e provaram a genuinidade da mesma.
A segunda ilustração é Raabe
(cfr. #Js 2.1 e segs.; #Hb 11.31). A fé que ela tinha no Deus de Israel era de
tal qualidade que se expressou em fazer ela o que pôde para proteger os Servos
do Senhor.
Conclusão:
>Tg-2.26
No vers. 26 Tiago conclui e
sumariza todo o argumento. "A morte se patenteia pela ausência de
atividade física e pela presença da corrupção; assim a fé, sem santidade
prática, não mostra atividade e se corrompe" (Cent. Bible). Fé genuína
resulta em boas obras. Estas não oferecem maior segurança à nossa posição
perante Deus, porém são evidências da fé, pela qual alcançamos essa posição.
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